Lei nº 14.550/2023.
A Lei n. 14.550/2023 incluiu três novos parágrafos ao art. 19 da Lei n. 11.340/2006, relativamente à disciplina das medidas protetivas de urgência.
Lei nº 11.340/2006 – Lei Maria da Penha
Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
(…)
§ 4º As medidas protetivas de urgência serão concedidas em juízo de cognição sumária a partir do depoimento da ofendida perante a autoridade policial ou da apresentação de suas alegações escritas e poderão ser indeferidas no caso de avaliação pela autoridade de inexistência de risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes. (Incluído pela Lei nº 14.550, de 2023)
§ 5º As medidas protetivas de urgência serão concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência. (Incluído pela Lei nº 14.550, de 2023)
§ 6º As medidas protetivas de urgência vigorarão enquanto persistir risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes. (Incluído pela Lei nº 14.550, de 2023)
A alteração legislativa veio a reforçar que a concessão da medida protetiva, ou seja, o ato inicial, urgente e imediato de se deferir a medida para tutelar a vida e a integridade física e psíquica da vítima, prescinde de qualquer formalidade e repele qualquer obstáculo que possa causar morosidade ou embaraço à efetividade da proteção pretendida.
Assim, não se deve perquirir, neste primeiro momento, se há perfeita compatibilidade entre a conduta narrada pela vítima como praticada pelo agressor e alguma figura típica penal.
Tampouco se deve exigir o registro de boletim de ocorrência, e menos ainda a existência de inquérito ou de ação cível ou penal. O que se busca é a celeridade da tutela estatal e, com ela, a efetividade da medida protetiva, que cumpre sua finalidade ao impedir a concretização da ameaça, a continuidade da prática ou o agravamento do ato lesivo contra a mulher.
Medidas pré-cautelares.
Nesse cenário, as medidas protetivas deferidas nos termos do § 5º do art. 19 da Lei n. 11.340/2006 devem ser consideradas como pré-cautelares, pois precedem a uma cautelar propriamente dita, e tem como objetivo a paralisação imediata do ato lesivo praticado ou em vias de ser praticado pelo agressor.
Enquanto pré-cautelares, as medidas protetivas podem ser concedidas em caráter de urgência, de forma autônoma e independente de qualquer procedimento, podendo até mesmo ser deferidas pelo próprio delegado ou pelo policial, na hipótese do art. 12-C da Lei n. 11.340/2006.
Lei nº 11.340/2006 – Lei Maria da Penha
Art. 12-C. Verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física ou psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou de seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida:
I. pela autoridade judicial;
II. pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de comarca; ou
III. pelo policial, quando o Município não for sede de comarca e não houver delegado disponível no momento da denúncia.
As medidas protetivas de urgência não perdem a natureza cautelar, mas apenas ganham uma fase pré-cautelar.
As medidas protetivas de urgência não perdem a natureza cautelar, mesmo depois da Lei n. 14.450/2023, mas apenas ganham uma fase pré-cautelar, à luz do art. 19, § 5º, da Lei n. 11.340/2006. Após o momento inicial de cessação do risco imediato, as medidas seguem o procedimento cautelar tal como antes.
Ademais, estão mantidos os aspectos das medidas protetivas de urgência que denotam a sua natureza penal (incisos I, II e III do art. 22):
O envolvimento de valores fundamentais da vítima (vida, integridade física, psicológica e mental) e do suposto autor (liberdade de ir e vir);
A possibilidade de decretação de prisão em caso de renitência no descumprimento das medidas protetivas pelo agressor;
O paralelismo existente entre as medidas protetivas da Lei Maria da Penha e as medidas cautelares penais alternativas à prisão previstas no art. 319, II e III, do CPP.
Caso em análise.
No caso em análise, as medidas deferidas referem-se à proibição de aproximação da ofendida e das testemunhas e proibição de estabelecer contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas, previstas no art. 22, II e III, da Lei Maria da Penha, todas de cunho penal, de modo que o recurso de apelação defensivo deve ser revisado sob o prisma do Direito Processual Penal.
As medidas protetivas de urgência previstas no art. 22, incisos I, II e III, da Lei n. 11.340/2006 são medidas cautelares de natureza criminal.
Portanto, mantém-se a orientação há muito firmada nesta Corte – e reiterada no julgamento do REsp 2.009.402/GO – no sentido de que as medidas protetivas de urgência previstas no art. 22, incisos I, II e III, da Lei n. 11.340/2006 são medidas cautelares de natureza criminal, devendo a elas ser aplicado o procedimento previsto no CPP, com aplicação apenas subsidiária do CPC.
STJ. Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 5/9/2023 (info 786).
APROFUNDANDO!
Quais são as medidas previstas no art. 22 da Lei Maria da Penha?
Vejamos:
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I. suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II. afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III. proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
IV. restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V. prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
VI. comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação; e
VII. acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio.
Qual a natureza das medidas protetivas de urgência previstas no art. 22 da Lei Maria da Penha?
Aquelas previstas no art. 22, incisos I, II e III, da Lei n. 11.340/2006 são de natureza criminal. Já as dispostas nos demais incisos desse dispositivo têm natureza cível. STJ. REsp 2.009.402-GO, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Rel. Acd. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por maioria, julgado em 08/11/2022 (info 756).
Jurisprudência em Teses do STJ, Ed. 206:
Tese 2: As medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do art. 22 da Lei Maria da Penha têm natureza jurídica de cautelares penais e, por isso, devem ser analisadas à luz do Código de Processo Penal, logo não há falar em citação do requerido para apresentar contestação, tampouco em decretação da revelia, nos moldes da lei processual civil.
Tese 3: As medidas protetivas deferidas com base no art. 22, incisos I, II e III, da Lei n. 11.340/2006 possuem natureza penal, por essa razão deve ser reconhecida a incompetência das Câmaras Cíveis para apreciar e julgar recursos propostos contra referidas medidas.
Tese 10: Cabe habeas corpus para apurar eventual ilegalidade na fixação de medida protetiva de urgência consistente na proibição de aproximar-se de vítima de violência doméstica e familiar, pois limita a liberdade de ir e vir do paciente.