Caso concreto adaptado.
José, professor universitário, durante anos escondeu uma câmera em determinado local da universidade, capturando imagens íntimas de alunas, servidoras e de uma funcionária terceirizada, e armazenando o conteúdo em um HD Externo.
Certo dia, um aluno da universidade descobriu o conteúdo e se apropriou do HD Externo, o entregando à reitoria da universidade.
José poderá ser demitido?
Sim, pois trata-se de incontinência pública e conduta escandalosa.
Desnecessidade de verificar se houve crime de assédio sexual para efeitos de condenação no processo administrativo.
Cabe ressaltar que “as instâncias cível, penal e administrativa são independentes. Desse modo, a sentença penal absolutória por ausência de provas do ora recorrente não repercute no exame do residual administrativo que envolve os fatos narrados” (AR 6.596/BA, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 29/11/2021).
Dessa forma, apresentam-se desnecessárias maiores considerações a respeito de a conduta narrada no Processo Administrativo Disciplinar – PAD caracterizar, ou não, o crime de assédio sexual previsto no art. 216-A do Código Penal (“Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”), haja vista que não foi esse o fundamento da sanção de demissão, e sim a conclusão de que a conduta imputada ao recorrente se subsume ao disposto no art. 132, V, da Lei n. 8.112/1990, qual seja: incontinência pública e conduta escandalosa.
Incontinência pública e conduta escandalosa.
A incontinência pública é o comportamento de natureza grave, tido como indecente, que ocorre de forma habitual, ostensiva e em público.
Conquanto se apresente correta a assertiva de que, para justificar a aplicação da pena de demissão, a incontinência praticada pelo servidor deva ser, além de pública, também escandalosa e grave, há que se ressaltar que a “conduta escandalosa”, como referida no dispositivo legal em tela, possui natureza autônoma, ostentando, via de consequência, requisitos próprios.
De fato, a conduta escandalosa refere-se àquela que, embora também ofenda a moral administrativa, pode ocorrer de forma pública ou às ocultas, reservadamente, mas que em momento posterior chega ao conhecimento da Administração.
Nesse contexto, a conduta praticada pelo ora recorrente – que “filmava, por meio de câmera escondida, alunas, servidoras e funcionárias terceirizadas”, realmente caracteriza a infração prevista no art. 132, V, parte final, da Lei n. 8.112/1990, o que atrai a pena de demissão do servidor público. STJ. REsp 2.006.738-PE, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 14/2/2023 (info 764).