Crime de redução a condição análoga à de escravo.
O crime de redução a condição análoga à de escravo corresponde a:
• Reduzir alguém a condição análoga à de escravo,
◦ quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva,
◦ quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho,
◦ quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.
Portanto, o tipo penal é de ação múltipla e de conteúdo variado, podendo ser configurado por qualquer das três condutas distintas, sendo certo que a prática que qualquer delas configura o crime.
No caso concreto, o Tribunal de origem manteve a absolvição sumária dos acusados por não existir efetivo cerceamento da liberdade dos trabalhadores.
O Tribunal de origem manteve a absolvição sumária dos acusados, em razão da atipicidade da conduta, ao fundamento de que, malgrado existentes indícios de que as vítimas trabalhavam em condições degradantes, tendo em vista a precariedade dos alojamentos e da alimentação, não teria havido efetivo cerceamento da liberdade dos trabalhadores, o que seria suficiente para afastar a configuração do delito previsto no art. 149 do Código Penal.
A efetiva restrição de liberdade das vítimas é prescindível (dispensável) para a configuração do crime de redução a condição análoga à de escravo.
Contudo, o referido entendimento diverge da orientação firmada por esta Corte, segundo a qual “o crime de redução a condição análoga à de escravo pode ocorrer independentemente da restrição à liberdade de locomoção do trabalhador, uma vez que esta é apenas uma das formas de cometimento do delito, mas não é a única.
O referido tipo penal prevê outras condutas que podem ofender o bem juridicamente tutelado, isto é, a liberdade de o indivíduo ir, vir e se autodeterminar, dentre elas submeter o sujeito passivo do delito a condições degradantes de trabalho” (REsp 1.223.781/MA, Quinta Turma, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 29/8/2016).
Nessa linha, “o delito de submissão à condição análoga à de escravo se configura independentemente de restrição à liberdade dos trabalhadores ou retenção no local de trabalho por vigilância ou apossamento de seus documentos, como crime de ação múltipla e conteúdo variado, bastando, a teor do art. 149 do CP, a demonstração de submissão a trabalhos forçados, a jornadas exaustivas ou a condições degradantes.” (REsp 1.843.150/PA, Sexta Turma, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, DJe de 2/6/2020).
No caso concreto, existiam indícios de que os trabalhadores atuavam em condições degradantes.
Portanto, ante a existência de indícios de que os trabalhadores atuavam em condições degradantes e tendo em vista que a efetiva restrição de liberdade das vítimas é prescindível para a configuração do tipo penal em espécie, o qual consubstancia crime de ação múltipla e de conteúdo variado, a conduta imputada aos denunciados pode, em tese, revelar-se típica.
STJ. REsp 1.969.868-MT, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023 (info 787).