Eleições proporcionais e eleições majoritárias.
O sistema eleitoral brasileiro utiliza tanto o sistema majoritário quanto o proporcional, dependendo do tipo de eleição. Vou explicar cada um deles e em que tipo de eleição são utilizados no Brasil.
• Sistema majoritário: Nele os candidatos disputam “por cabeça”. Será eleito aquele candidato que receber mais votos.
◦ Utilizado para os cargos de Presidente da República, Governador(a) do Estado e do DF, Prefeitos(as) Municipais e Senadores(as).
• Sistema proporcional: Nesse sistema, o número de candidatos eleitos por cada partido ou federação partidária dependerá do número total de votos por ela recebidos. Consideram-se eleitos os candidatos mais bem votados do partido, até o número total de vagas que este terá direito.
◦ Utilizado para os cargos de Deputado(a) Federal e Estadual e Vereador(a).
A principal diferença entre os dois sistemas é que o majoritário foca na eleição de indivíduos, privilegiando os candidatos mais votados, enquanto o proporcional busca uma representação equitativa das diversas correntes políticas, baseando-se na votação obtida pelos partidos ou coligações.
Como funciona a distribuição das cadeiras na eleição proporcional?
Dois conceitos são muito importantes para entender como funciona a divisão. São eles:
• Quociente Eleitoral: é determinado pela divisão do número total de votos válidos pelo número de vagas a serem preenchidas. Apenas os votos dados a partidos ou coligações são considerados para este cálculo.
• Quociente Partidário: após definido o quociente eleitoral, calcula-se o quociente partidário para cada partido ou coligação, dividindo-se o número de votos válidos que o partido ou coligação recebeu pelo quociente eleitoral. O resultado indica o número de vagas que cada partido ou coligação inicialmente obterá.
Exemplo.
Vamos criar um exemplo prático de eleição para vereador em uma cidade brasileira fictícia, com 100.000 votos válidos e 10 vagas para vereador, e 6 partidos concorrendo.
Passo 1: Total de Votos e Quociente Eleitoral
O quociente eleitoral (QE) é calculado dividindo o total de votos válidos pelo número de vagas disponíveis. Assim, com 100.000 votos válidos e 10 vagas:
• QE = Total de votos válidos / número de vagas
◦ QE = 100.000 / 10 → QE = 10.000
Portanto, no exemplo, o quociente eleitoral (QE) é 10.000 votos. Isso significa que cada partido precisará de 10.000 votos para eleger um vereador.
Passo 2: Definir o Quociente Partidário.
Haviam 6 partidos concorrendo, sendo que cada um recebeu a seguinte votação:
• Partido A: 50.000 votos
• Partido B: 24.000 votos
• Partido C: 7.200 votos
• Partido D: 6.000 votos
• Partido E: 5.600 votos
• Partido F: 5.400 votos
O quociente partidário (QP) de cada partido é calculado dividindo o total de votos do partido pelo quociente eleitoral (QP = Votos Partido / QE):
• Partido A: 50.000 votos → QP = 50.000 / 10.000 → QP = 5 → 5 vagas diretas
• Partido B: 24.000 votos → QP = 24.000 / 10.000 → QP = 2 → 2 vagas diretas
• Partidos C, D, E e F: Não atingem o quociente eleitoral diretamente.
Passo 3: Distribuição das Sobras.
De acordo com o Art. 109, distribuímos as sobras dividindo o número de votos válidos de cada partido pelo número de lugares obtidos mais um. Para simplificar, focaremos nas três distribuições das sobras para atender ao critério de inclusão dos partidos que não atingiram inicialmente o quociente eleitoral.
Há, entretanto, uma limitação. Só participam da distribuição das sobras os os partidos que participaram do pleito, desde que tenham obtido pelo menos 80% (oitenta por cento) do quociente eleitoral e os candidatos que obtiveram ao menos 20% desse quociente.
Art. 109§ 2º Poderão concorrer à distribuição dos lugares todos os partidos que participaram do pleito, desde que tenham obtido pelo menos 80% (oitenta por cento) do quociente eleitoral, e os candidatos que tenham obtido votos em número igual ou superior a 20% (vinte por cento) desse quociente. (Redação dada pela Lei nº14.211, de 2021)
No nosso exemplo, apenas os partidos A e B receberam mais de 80% do quociente eleitoral. Vejamos:
Primeira Distribuição de Sobras
• Partido A: 50.000 / 6 = 8.333.33
◦ O Partido A recebeu 50.000 votos e já elegeu 5 vereadores. Portanto, agora dividiremos 50.000 / 6, já que 5 + 1 = 6.
• Partido B: 24.000 / 3 = 8.000
◦ O Partido B recebeu 24.000 votos e já elegeu 2 vereadores. Portanto, agora dividiremos 24.000 / 3, já que 2 + 1 = 3.
Como o resultado da divisão foi maior para o Partido A (8.333.33) do que para o Partido B (8.000), o Partido A elegeu mais um candidato. Portanto, agora:
• Partido A: 50.000 votos → 6 Vagas
• Partido B: 24.000 votos → 2 Vagas
Segunda Distribuição de Sobras
A operação deverá ser repetida:
• Partido A: 50.000 / 7 = 7.142.85
◦ O Partido A recebeu 50.000 votos e já elegeu 6 vereadores. Portanto, agora dividiremos 50.000 / 7, já que 5 + 1 = 6.
• Partido B: 24.000 / (2 + 1) = 8.000
◦ O Partido B recebeu 24.000 votos e já elegeu 2 vereadores. Portanto, agora dividiremos 24.000 / 3, já que 2 + 1 = 3.
Como o resultado da divisão foi maior para o Partido B (8.000) do que para o Partido A (7.142.85,57), o Partido B elegeu mais um candidato. Portanto, agora:
• Partido A: 50.000 votos → 6 Vagas
• Partido B: 24.000 votos → 3 Vagas
Terceira Distribuição de Sobras
Perceba que até agora foram eleitos 9 vereadores de um total de 10 vagas, portanto ainda resta uma vaga.
O STF entendeu na ADIs 7.228/DF, ADI 7.263/DF, ADI 7.325/DF que na terceira distribuição de sobras, todos os partidos podem participar, mesmo que tenham obtido menos de menos 80% (oitenta por cento) do quociente eleitoral.
A fim de viabilizar a ocupação dos lugares por candidatos de partidos pequenos com expressiva votação, a 3ª etapa de distribuição das vagas das eleições proporcionais (“sobras eleitorais”) contará com a participação de todos os partidos políticos, independentemente de terem obtido número de votos equivalente à determinada porcentagem pré-definida do quociente eleitoral.
STF. ADI 7.228/DF, ADI 7.263/DF, ADI 7.325/DF, relator Ministro Ricardo Lewandowski, redatora do acórdão Ministra Cármen Lúcia, julgamento finalizado em 28.02.2024 (info 1126).
Portanto, vamos para mais uma divisão:
• Partido A: 50.000 / 7 = 7.142.85
◦ O Partido A recebeu 5.000 votos e já elegeu 6 vereadores. Portanto, agora dividiremos 50.000 / 7, já que 5 + 1 = 6.
• Partido B: 24.000 / (2 + 1) = 8.000
◦ O Partido B recebeu 24.000 votos e já elegeu 2 vereadores. Portanto, agora dividiremos 24.000 / 3, já que 2 + 1 = 3.
• Partido C: 7.200 / (0 + 1) = 7.200
◦ O Partido C recebeu 7.200 votos e já elegeu 0 vereadores. Portanto, agora dividiremos 7.200 / 1, já que 0 + 1 = 1.
• Partidos D, E e F: não elegeram ninguém.
Portanto, nesta terceira fase, o Partido C conseguiu eleger um candidato, apesar de não ter obtido os 80% dos votos do quociente eleitoral.
A fim de viabilizar a ocupação dos lugares por candidatos de partidos pequenos com expressiva votação, a 3ª etapa de distribuição das vagas das eleições proporcionais (“sobras eleitorais”) contará com a participação de todos os partidos políticos, independentemente de terem obtido número de votos equivalente à determinada porcentagem pré-definida do quociente eleitoral.
Nesta fase de distribuição das vagas remanescentes, a restrição imposta pela cláusula de desempenho (Código Eleitoral/1965, art. 109, § 2º) ofende o pluralismo político (CF/1988, art. 1º, V) e exclui do Poder Legislativo cidadãos com altíssima densidade eleitoral em detrimento de candidatos com baixa representatividade, isto é, beneficia os grandes partidos ao passo que dificulta a efetiva participação de partidos menores.
Mas o o art. 111 do Código Eleitoral?
O art. 111 do código eleitoral determina que “Se nenhum partido alcançar o quociente eleitoral, considerar-se-ão eleitos, até serem preenchidos todos os lugares, os candidatos mais votados”. Ocorre que tal dispositivo foi considerado inconstitucional. Vejamos:
É inconstitucional — por ofensa ao caráter proporcional das eleições parlamentares — a regra do Código Eleitoral que prevê que, caso nenhum partido alcance o quociente eleitoral, as vagas devem ser preenchidas pelos candidatos mais votados.
Essa regra configura um modo dissimulado e flagrantemente inconstitucional de implantar um sistema majoritário, semelhante ao conhecido “distritão”, amplamente rejeitado nos debates parlamentares nos quais se buscava implementá-lo.
STF. ADI 7.228/DF, ADI 7.263/DF, ADI 7.325/DF, relator Ministro Ricardo Lewandowski, redatora do acórdão Ministra Cármen Lúcia, julgamento finalizado em 28.02.2024 (info 1126).
A decisão vale a partir das eleições de 2024.
O Plenário, por maioria, atribuiu efeito ex nunc à decisão, para que surta efeitos apenas a partir do pleito de 2024, dada a incidência do artigo 16 da CF/1988.
Constituição Federal.
Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.
Conclusões.
Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, em apreciação conjunta, julgou parcialmente procedentes as ações para
(i) dar interpretação conforme a Constituição ao § 2° do artigo 109 do Código Eleitoral/1965 a fim de permitir que todas as legendas e seus candidatos participem da distribuição das cadeiras remanescentes descrita no inciso III do artigo 109 do Código Eleitoral/1965, independentemente de terem alcançado a exigência dos 80% e 20% do quociente eleitoral, respectivamente; e
(ii) declarar a inconstitucionalidade do artigo 111 do Código Eleitoral/1965 e do artigo 13 da Resolução TSE nº 23.677/2021 para que, no caso de nenhum partido alcançar o quociente eleitoral, sejam aplicados, sucessivamente, o inciso I c/c o § 2° e, na sequência, o inciso III do art. 109 do Código Eleitoral/1965, de maneira que a distribuição das cadeiras ocorra, primeiramente, com a aplicação da cláusula de barreira 80/20 e, quando não houver mais partidos e candidatos que atendam tal exigência, as cadeiras restantes sejam distribuídas por média, com a participação de todos os partidos, ou seja, nos moldes da 3ª fase, sem exigência da cláusula de desempenho 80%, em estrito respeito ao sistema proporcional. Além disso, o Plenário, por maioria, atribuiu efeito ex nunc à decisão, para que surta efeitos apenas a partir do pleito de 2024, dada a incidência do artigo 16 da CF/1988.
STF. ADI 7.228/DF, ADI 7.263/DF, ADI 7.325/DF, relator Ministro Ricardo Lewandowski, redatora do acórdão Ministra Cármen Lúcia, julgamento finalizado em 28.02.2024 (info 1126).