A interpretação no sentido da obrigatoriedade da audiência prevista no artigo 16 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), sem que haja pedido de sua realização pela ofendida, viola o texto constitucional e as disposições internacionais que o Brasil se obrigou a cumprir, na medida em que discrimina injustamente a própria vítima de violência.
A audiência perante o juiz, de que trata o referido dispositivo para as ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida, tem a finalidade de viabilizar que a vítima, devidamente assistida por uma equipe multidisciplinar, expresse, de forma livre, a sua vontade. Não se trata da mera avaliação da presença de um requisito procedimental, de modo que não cabe ao magistrado delegar a realização da audiência a outro profissional, ou designá-la de ofício ou a requerimento de outra parte.
Visto que a garantia da liberdade somente é assegurada caso a própria vítima, de forma exclusiva, solicite a realização dessa solenidade, determinar o seu comparecimento ao ato configura desrespeito a sua intenção, que, nesse caso, deve prevalecer.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou parcialmente procedente a ação para dar interpretação conforme a Constituição ao artigo 16 da Lei 11.340/2006, no sentido de reconhecer a inconstitucionalidade
(i) da designação, de ofício, da audiência nele prevista; e
(ii) do reconhecimento de que eventual não comparecimento da vítima de violência doméstica implique “retratação tácita” ou “renúncia tácita ao direito de representação.
STF. ADI 7.267/DF, relator Ministro Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 21.8.2023 (info 1104).
APROFUNDANDO!
Necessidade de retratação em audiência.
Se a vítima comparece ao cartório e manifesta interesse em se retratar, ainda assim o juiz deverá designar a audiência para ouvir a ofendida e o MP, não podendo rejeitar a denúncia sem cumprir esse procedimento. STJ. 5ª Turma. HC 138.143-MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 03/09/2019 (Info 656).
A realização da audiência prevista no art. 16 da Lei n. 11.340/2006 somente se faz necessária se a vítima houver manifestado, de alguma forma, em momento anterior ao recebimento da denúncia, ânimo de desistir da representação.
STJ. AgRg no REsp 1.946.824-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 14/06/2022, DJe 17/06/2022 (info 743).
#Tese Repetitiva – Tema 1167: A audiência prevista no art. 16 da Lei n. 11.340/2006 tem por objetivo confirmar a retratação, não a representação, e não pode ser designada de ofício pelo juiz. Sua realização somente é necessária caso haja manifestação do desejo da vítima de se retratar trazida aos autos antes do recebimento da denúncia.
STJ. REsp 1.977.547-MG, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 8/3/2023 (info 766).