Conceitos Necessários:
Lucros Cessantes: São os ganhos que o prejudicado deixou de obter em virtude da ação ilícita praticada por outrem.
Royalties: São compensações pagas pelo uso de propriedade intelectual, como patentes.
Perícia: Análise técnica especializada realizada por um perito, com o objetivo de esclarecer determinados aspectos de uma questão judicial.
Caso concreto adaptado.
Suponha que a Empresa A detenha patentes de uma tecnologia específica para fabricação de brocas e punhos utilizados na perfuração de furo de gusa. Já a Empresa B, concorrente, é acusada de infringir tais patentes em alguns de seus produtos.
Para calcular os lucros cessantes devidos à Empresa A, é realizada uma perícia contábil, que não leva em conta aspectos técnicos das patentes envolvidas. A Empresa B argumenta que alguns de seus produtos não infringem as patentes da Empresa A e que a perícia deveria ser técnica, não apenas contábil. Além disso, questiona-se o uso de um documento produzido unilateralmente pela Empresa A para comprovar o percentual de royalties.
A perícia contábil é suficiente para aferir os lucros cessantes devidos à Empresa A pela Empresa B, ou é necessária uma perícia técnica para analisar a questão das patentes envolvidas?
A perícia contábil não é suficiente. É necessária uma perícia técnica para analisar a questão das patentes envolvidas.
Controvérsia.
A controvérsia em análise discutiu-se a respeito da (im)possibilidade de utilização de documento unilateralmente produzido para comprovar o percentual de royalties, bem como a inexistência de indicação dos critérios técnicos utilizados pelo perito.
No caso, argumenta-se que a perícia teria desconsiderado o fato de que algumas das brocas e dos punhos por ela comercializados não infringiriam as patentes do recorrido, sustentando, ainda, que as hastes de perfuração de furo de gusa seriam compostas não apenas pelo punho e pela broca, mas também pela haste, que estaria fora do escopo de proteção das patentes da recorrida.
Além disso, houve realização somente de perícia meramente contábil, o que gerou debates sobre não ter havido perícia com conhecimento específico na área técnica das patentes em questão.
Impossibilidade de adoção de métodos arbitrários para a aferição dos lucros cessantes.
Importa, assim, asseverar que a previsão da Lei n. 9.279/1996 de que o cálculo dos lucros cessantes será realizado pelo critério mais favorável ao prejudicado (art. 210) não pode levar à adoção de métodos arbitrários para sua aferição, sob pena de enriquecimento sem causa.
Lei nº 9.279/1996 – Lei de Propriedade Industrial
Art. 210. Os lucros cessantes serão determinados pelo critério mais favorável ao prejudicado, dentre os seguintes:
I. os benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido; ou
II. os benefícios que foram auferidos pelo autor da violação do direito; ou
III. a remuneração que o autor da violação teria pago ao titular do direito violado pela concessão de uma licença que lhe permitisse legalmente explorar o bem.
Portanto, a distribuição dinâmica do ônus da prova demanda respeito ao contraditório, o que não foi observado no caso.
Ausência de Amplo Exercício de Contraditório e Ampla Defesa.
Assim, percebe-se objetivamente que está caracterizada a ausência de amplo exercício de contraditório e ampla defesa, em decorrência da necessidade de realização de perícia técnica com conhecimento específico na área técnica das patentes, além do importante debate trazido de utilização de documento unilateralmente produzido pelo recorrido para comprovar o percentual de royalties.
Conclusão…
A previsão do art. 210 da Lei n. 9.279/1996 de que o cálculo dos lucros cessantes será realizado pelo critério mais favorável ao prejudicado não pode levar à adoção de métodos arbitrários para sua aferição, sem ter havido perícia com conhecimento específico na área técnica das patentes em questão.
STJ. REsp 1.848.863-SP, Rel. Min. Humberto Martins, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/9/2023 (info 789).