Art. 112, §3º, V, da Lei de Execução Penal: o que significa “não ter integrado organização criminosa”?
A controvérsia diz respeito à amplitude interpretativa do inciso V do § 3º do art. 112 da Lei de Execução Penal, especialmente, os limites da expressão “não ter integrado organização criminosa”.
Lei nº 7.210/1984 – Lei de Execução Penal.
Art. 112, §3º No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência, os requisitos para progressão de regime são, cumulativamente:
I. não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa;
II. não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente;
III. ter cumprido ao menos 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior;
IV. ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento;
V. não ter integrado organização criminosa.
Inicialmente, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça interpretou o dispositivo estritamente para restringir a progressão especial aos casos em que a ré tivesse sido condenada pelo delito descrito na Lei n. 12.850/2013. No entanto, a jurisprudência evoluiu para admitir interpretação extensiva da norma, impondo como óbice à progressão especial a condenação por delitos associativos, como a associação para o tráfico.
Caso concreto.
No caso, a instância local deu amplitude ainda maior ao dispositivo. Entendeu que ao afastar a minorante do art. 33, §4º, da Lei de Drogas por entender que não estava presente o requisito do agente “não se dedicar às atividades criminosas nem integrar organização criminosa”, também não seria possível a progressão especial de regime posto que evidenciada a “integração a organização criminosa”.
O afastamento da progressão de regime foi indevido.
Esse dispositivo permite afastar a minorante em casos nos quais não há acusação ou prova da prática de crime associativo, associação para o tráfico (art. 35 da Lei n. 11.343/2006), organização criminosa (2º da Lei n. 12.850/2013) ou mesmo associação criminosa (art. 288 do Código Penal). Trata-se de hipótese cujos elementos, insuficientes para tipificação, mostram-se suficientes para afastar uma causa de diminuição da pena.
Considerando o princípio da legalidade no âmbito da execução, as apenadas podem ter limitados seus direitos apenas pelo expressamente previsto na lei e na sentença condenatória. Já pelo princípio da individualização da pena, deve ser evitada a padronização da reprimenda, que deve ser adequada a cada reeducanda, considerando sua personalidade, seu histórico prisional e sua evolução carcerária.
Na espécie, os fundamentos utilizados para não aplicar a minorante nem sequer indicam que a sentenciada integra organização criminosa, mas apenas que se dedica a atividades criminosas, o que, efetivamente, extrapola os limites do princípio da legalidade e da individualização da pena. Na prática, admitida a interpretação dada pela origem, toda condenada por tráfico, gestante ou mãe, que tivesse a causa de diminuição afastada, não poderia progredir de regime, nos termos do § 3º do art. 112 da Lei de Execução Penal.
A vedação da progressão especial para todas as condenadas por tráfico de drogas sem incidência da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 não encontra aporte legal.
Portanto, a vedação da progressão especial pela via interpretativa para todas as condenadas por tráfico de drogas sem incidência da causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 não encontra aporte legal, devendo se restringir a vedação do inciso V do § 3º do art. 112 da Lei de Execução Penal aos casos em que houve condenação por crime associativo.
STJ. HC 888.336-SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 13/8/2024, DJe 15/8/2024 (info 827).