Exemplo Didático
Imaginemos um banco internacional, Banco Global, que celebrou contratos de empréstimo com uma empresa brasileira, a Brasileira Ltda., no Panamá. O contrato incluía uma cláusula que permitia ao Banco Global escolher o foro para a execução do contrato. O Banco optou por executar o contrato no Brasil devido à mora da Brasileira Ltda.

O Banco Global inicia uma ação de execução de título extrajudicial no Brasil, e a Brasileira Ltda. opõe embargos à execução, alegando que os juros cobrados são abusivos segundo as normas brasileiras.

A Brasileira Ltda. pode opor embargos à execução no Brasil, mesmo que o contrato tenha sido celebrado e regido por leis estrangeiras?
Sim, a Brasileira Ltda. pode opor embargos à execução no Brasil. Caso exista previsão contratual que faculte ao credor a escolha do foro de execução e este opte pela execução dos contratos de empréstimos celebrados no exterior perante a Justiça brasileira, deve haver submissão à forma processual típica de tal via processual, inclusive quanto ao conhecimento e julgamento dos respectivos embargos à execução.

Controvérsia.
Debate-se nos autos a jurisdição nacional para conhecer e processar embargos à execução opostos por devedor brasileiro em contraposição à ação de execução de título extrajudicial manejada por instituição financeira estrangeira perante a justiça brasileira.

Possibilidade do contrato internacional facultar às partes a eleição da legislação brasileira.
Inicialmente, cumpre ressaltar que a previsão, em contrato internacional, que faculta às partes a eleição de uma jurisdição nacional distinta da do local da contratação é hipótese reconhecida pela legislação brasileira de jurisdição internacional concorrente (CPC, art. 22, III).

Código de Processo Civil.
Art. 22. Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações: (…)
III. em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional.

Ao eleger a jurisdição brasileira, a legislação processual nacional será aplicada.
Nesse sentido, ao eleger a jurisdição brasileira, ainda que o contrato seja regido por legislação estrangeira para fins de validade do negócio jurídico, o procedimento judicial respectivo será regido pelas regras processuais estabelecidas na legislação nacional, conforme interpretação dos arts. 9º, 12 e 14 da LINDB e 22 do CPC.

Lei de introdução às normas do direito brasileiro
Art. 9º Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem.
§ 1º Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato.
§ 2º A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.
(…)
Art. 12. É competente a autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação.
§ 1º Só à autoridade judiciária brasileira compete conhecer das ações relativas a imóveis situados no Brasil.
§ 2º A autoridade judiciária brasileira cumprirá, concedido o exequatur e segundo a forma estabelecida pela lei brasileira, as diligências deprecadas por autoridade estrangeira competente, observando a lei desta, quanto ao objeto das diligências.
(…)
Art. 14. Não conhecendo a lei estrangeira, poderá o juiz exigir de quem a invoca prova do texto e da vigência.
(…)
Art. 22. Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.
§ 1º Em decisão sobre regularidade de conduta ou validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, serão consideradas as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente.
§ 2º Na aplicação de sanções, serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para a administração pública, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes do agente.
§ 3º As sanções aplicadas ao agente serão levadas em conta na dosimetria das demais sanções de mesma natureza e relativas ao mesmo fato.

Em execução de título extrajudicial, por sua vez, o meio de defesa legalmente previsto se instrumentaliza por meio dos embargos à execução, cuja natureza de ação autônoma de oposição não afasta sua função precípua de materialização do contraditório, admitindo, por consequência, a dedução de defesas processuais e materiais.

No caso concreto, é viável a apresentação de embargos à execução.
No caso concreto, tendo em vista a previsão contratual que facultava ao credor a escolha do foro de execução, a instituição financeira optou por executar contratos de empréstimos celebrados no exterior perante a Justiça brasileira, devendo, por consequência, submeter-se à forma processual típica dessa via processual, inclusive ao conhecimento e julgamento dos respectivos embargos opostos à execução pelos executados, via processual adequada ao exercício da ampla defesa e do contraditório.

Dessa forma, a existência de processo de liquidação da instituição financeira credora perante autoridade estrangeira, no caso, a liquidação de instituição financeira em trâmite no Panamá, não modifica a jurisdição internacional do Poder Judiciário brasileiro para as ações individuais aqui propostas.
STJ. REsp 1.966.276-SP, Rel. Ministro. Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 9/4/2024 (info 807).

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