Controvérsia acerca da competência.
A controvérsia consiste em definir se a competência para o processamento e o julgamento do crime de produção de medicamentos sem registro competente é da Justiça federal ou da estadual, na hipótese em que a organização criminosa adquire matérias-primas clandestinas oriundas do exterior.

Caso concreto.
No caso, embora a investigação não haja demonstrado seguramente que houve a importação dos produtos ou das matérias-primas – a ponto de justificar a imputação penal dessa conduta na denúncia – também não foi possível desprezar o fato de que houve o reconhecimento da existência de fortes referências concretas à aquisição de insumos no Paraguai.

Para efeitos de imputação penal, o local exato em que eram adquiridas as matérias-primas não teria relevância se consideradas as elementares indicadas (falsificar, corromper, adulterar, ter em depósito e comercializar produtos destinados a fins terapêuticos ou medicinais, desprovidos do registro devido no órgão de vigilância sanitária competente), motivo pelo qual a denúncia não se esmerou em apontar essa localidade. Evidentemente que essa circunstância implica consequências no âmbito da fixação da competência, motivo pelo qual deve ser avaliada a partir das investigações.

Não se exige prova inconteste acerca da transnacionalidade das condutas para a fixação da competência federal.
Contudo, a orientação desta Corte não exige prova inconteste acerca da transnacionalidade das condutas para a fixação da competência federal, mas tão somente a existência de indícios concretos de que isso haja ocorrido. Tais indícios até podem ser insuficientes para lastrear a denúncia na modalidade de importação, mas podem ser suficientes para a fixação da competência.

Ademais, a existência desses indícios pode ser também reforçada pelo fato de que a própria representação formulada pelo Ministério Público, durante as investigações, para a quebra do sigilo bancário e de bloqueio de bens dos acusados, lastreou-se na possível prática de contrabando de anfetaminas inibidoras de apetite oriundas do Paraguai. Ou seja, todos os indícios indicavam que esses produtos viriam do Paraguai.

Portanto, ainda que a denúncia não indique a origem das matérias-primas utilizadas pela organização criminosa para a produção de medicamentos clandestinos, isso não impossibilita – diante dos indícios concretos de que elas tenham sido adquiridas no exterior – que seja reconhecida a competência federal para o processo e julgamento do feito.
STJ. CC 188.135-GO, Rel. Ministra Laurita Vaz, Rel. para acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, por maioria, julgado em 8/2/2023, DJe 23/2/2023 (info 779).

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