Caso concreto adaptado.
José, beneficiário da justiça gratuita e residente na cidade de Bacurau, propôs ação requerendo benefício acidentário em face do INSS decorrente de acidente do trabalho, tendo a ação tramitado perante a Vara Única da cidade de Bacurau (Justiça Estadual).

No decorrer da ação, foi realizada perícia médica, cujos honorários devidos ao perito foram adiantados pelo INSS, conforme determinação legal:

Lei nº 13.876/2019.
Art. 1º O ônus pelos encargos relativos ao pagamento dos honorários periciais referentes às perícias judiciais realizadas em ações em que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) figure como parte e se discuta a concessão de benefícios assistenciais à pessoa com deficiência ou benefícios previdenciários decorrentes de incapacidade laboral ficará a cargo do vencido, nos termos da legislação processual civil, em especial do § 3º do art. 98 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).
(…)
§ 5º A partir de 2022, nas ações a que se refere o caput deste artigo, fica invertido o ônus da antecipação da perícia, cabendo ao réu (leia-se: INSS), qualquer que seja o rito ou procedimento adotado, antecipar o pagamento do valor estipulado para a realização da perícia, exceto na hipótese prevista no § 6º deste artigo (se o autor da ação contra o INSS tiver condições econômicas, ele deverá adiantar os honorários do perito).
§ 6º Os autores de ações judiciais relacionadas a benefícios assistenciais à pessoa com deficiência ou a benefícios previdenciários decorrentes de incapacidade laboral previstas no caput deste artigo que comprovadamente disponham de condição suficiente para arcar com os custos de antecipação das despesas referentes às perícias médicas judiciais deverão antecipar os custos dos encargos relativos ao pagamento dos honorários periciais.

Ao final, a ação foi julgada improcedente, motivo pelo qual o INSS requereu a execução dos honorários de perito adiantados, a serem suportados pelo Estado, com fundamento no Tema Repetitivo 1.044/STJ:

#Tese Repetitiva – Tema 1.044-STJ: Nas ações de acidente do trabalho, os honorários periciais, adiantados pelo INSS, constituirão despesa a cargo do Estado, nos casos em que sucumbente a parte autora, beneficiária da isenção de ônus sucumbenciais, prevista no parágrafo único do art. 129 da Lei 8.213/91.

O Juiz de Direito declinou da competência para julgamento do feito, por entender que “o credor desses honorários é o Instituto Nacional de Seguro Social — INSS, que é uma Autarquia Federal”, portanto, “a presença de uma Autarquia Federal no polo ativo da Execução altera a competência para processar e julgar o feito para a Justiça Federal.

O Juiz Federal, por sua vez, defendeu que “ainda que o exequente seja autarquia federal — o que, em regra, atrairia a competência para a Justiça Federal —, a fase cognitiva do processo tramitou perante a Justiça Estadual, por força da exceção constante no art. 109, I da CF, dada a natureza acidentária da causa”, motivo pelo qual, “considerando a sistemática do rito executivo civil e a noção de sincretismo processual, entendo que a competência estadual, para julgar demandas em que o INSS é parte, não se esgota na fase cognitiva do processo, devendo estender-se, também, para a fase de cumprimento de sentença.

Quem tem razão?
O Juiz Federal. Compete ao Juízo Estadual o processamento e julgamento do cumprimento de sentença promovido pelo INSS relativo ao ressarcimento de honorários periciais antecipados no bojo de ação acidentária.

Por que a ação foi proposta perante a Justiça Estadual?
Trata-se de uma exceção prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, que exclui da Justiça Federal a competência para julgar as ações decorrentes de acidente do trabalho. Portanto, nas ações propostas em virtude de acidente do trabalho:
Em face do INSS: A competência será da Justiça Estadual.
#Súmula 501-STF: Compete à Justiça Ordinária Estadual o processo e o julgamento, em ambas as instâncias, das causas de acidente do trabalho, ainda que promovidas contra a União, suas autarquias, empresas públicas ou sociedades de economia mista.
#Tese de Repercussão Geral – Tema 414-STF: Compete à Justiça Comum Estadual julgar as ações acidentárias que, propostas pelo segurado contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), visem à prestação de benefícios relativos a acidentes de trabalho.
Em face do empregador: A competência será da Justiça do Trabalho.
#Súmula Vinculante 22: A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da Emenda Constitucional 45/2004.

O art. 516 do CPC adota o sincretismo processual.
O art. 516 do CPC consagra a regra geral de competência para os títulos judiciais e decorre do sincretismo processual, a partir do qual o reconhecimento do direito e a sua efetivação ocorrem no mesmo processo, diferindo-se apenas por fases.

Código de Processo Civil.
Art. 516. O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante:
I. os tribunais, nas causas de sua competência originária;
II. o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição;
III. o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral, de sentença estrangeira ou de acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o exequente poderá optar pelo juízo do atual domicílio do executado, pelo juízo do local onde se encontrem os bens sujeitos à execução ou pelo juízo do local onde deva ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer, casos em que a remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem.

A competência é definida no momento do registro ou distribuição da petição inicial.
A norma ainda traduz princípio consagrado na parte geral do Código, segundo o qual a competência é determinada no momento do registro ou da distribuição da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta (art. 43 do CPC).

Assim, em regra, o juízo que formou o título executivo é o competente para executá-lo, estando as exceções previstas no próprio artigo de lei, de modo que somente não serão executados perante o juízo que processou a ação os títulos formados a partir:
de sentença penal condenatória,
de sentença arbitral,
de sentença estrangeira ou
de acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo ou, ainda,
nos casos em que os bens sujeitos à constrição judicial se encontrarem em foro diverso ou se diverso for o foro atual do domicílio do executado.

O caso não se enquadra em nenhuma das exceções acima.
E, no caso em discussão, observa-se que não se enquadra em nenhuma das situações que excepcionam a regra contida no art. 516, II, do CPC, porquanto a exequente pretende efetivar o direito à percepção dos honorários periciais antecipados na lide, em razão de o vencido ser beneficiário da justiça gratuita.

Competência da Justiça Estadual.
Nesse mesmo sentido, esta Corte vem reconhecendo a competência do Juízo Estadual para o processamento e julgamento do Cumprimento de Sentença promovido pelo INSS, relativo ao ressarcimento de honorários periciais antecipados no bojo de ação acidentária, nos seguintes julgados: CC n. 186.830/MS, relator Ministro Herman Benjamin, DJe de 12/4/2022; CC n. 186.831/MS, relator Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Federal convocado do TRF/5ª Região), DJe de 31/3/2022; CC n. 186.837/MS, relator Ministro Benedito Gonçalves, DJe de 28/3/2022; CC n. 186.666/MS, relator Ministro Francisco Falcão, DJe de 18/3/2022, entre outros.

Dessa forma, deve ser declarado competente para o processamento e julgamento do feito, no caso, o Juízo Estadual, ora suscitado.
STJ. CC 191.185-MS, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 28/2/2024, DJe 4/3/2024 (info 802).

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