Caso concreto adaptado.
Maria é beneficiária do plano de saúde X, com cobertura obstetrícia, sendo a titular do contrato. Sua filha Júlia, por sua vez, é sua dependente.

Júlia estava gestante, dando a luz a Enzo, nascido prematuro em 10/04/2023.

Suponha que não foi requerida a inscrição de Enzo no plano de saúde, ou mesmo que houve o requerimento mas o plano de saúde ilegalmente negou (as duas situações não mudam em nada a conclusão).

Por ter nascido prematuro, Enzo precisou ficar internado por 45 dias.

O plano de saúde pode interromper o tratamento após ultrapassado o 30º (trigésimo) dia de seu nascimento ou requerer o pagamento das diárias?
Não. Nos termos do art. 12, I, da Lei nº 9.656/1998, quando o plano incluir atendimento obstétrico, deverá haver cobertura assistencial ao recém-nascido, filho natural ou adotivo do consumidor, ou de seu dependente, durante os primeiros trinta dias após o parto;

Entretanto, o esgotamento do prazo de 30 (trinta) dias após o parto não pode provocar a descontinuidade do tratamento médico-hospitalar, devendo haver a extensão do trintídio legal até a alta médica do recém-nascido.

O recém-nascido sem inscrição no plano de saúde não pode ficar ao desamparo enquanto perdurar sua terapia, sendo sua situação análoga à do beneficiário sob tratamento médico, cujo plano coletivo foi extinto. Em ambas as hipóteses deve haver o custeio temporário, pela operadora, das despesas assistenciais até a alta médica, em observância aos princípios da boa-fé, da função social do contrato, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana.

Neste caso, não serão devidas diárias, mas apenas a contraprestação que seria devida caso o neonato fosse inscrito no plano de saúde.
Nessas situações, exaurido o prazo legal, o neonato não inscrito, a título de contraprestação, deve ser considerado como se inscrito fosse, mesmo que provisoriamente, o que lhe acarreta não o ressarcimento de despesas conforme os valores de tabela da operadora, mas o recolhimento de quantias correspondentes a mensalidades de sua categoria, a exemplo também do que acontece com os beneficiários sob tratamento assistencial em planos extintos. Manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da avença.

É abusiva a atitude da operadora que tenta descontinuar o custeio de internação do neonato após ultrapassado o prazo de 30 (trinta) dias de seu nascimento.
STJ. REsp 2.049.636-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/4/2023, DJe 28/4/2023 (info 773).

O neonato será considerado usuário por equiparação.
Em um caso concreto semelhante o STJ entendeu que fundado na dignidade da pessoa humana e em homenagem aos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e da segurança jurídica, a jurisprudência do STJ firmou a orientação de que, “não obstante seja possível a resilição unilateral e imotivada do contrato de plano de saúde coletivo, deve ser resguardado o direito daqueles beneficiários que estejam internados ou em pleno tratamento médico” (REsp 1.818.495/SP, Terceira Turma, julgado em 08/10/2019, DJe 11/10/2019).

Logo, ainda que se admita a extinção do vínculo contratual e, por conseguinte, a cessação da cobertura pela operadora do plano de saúde, é sempre garantida a continuidade da assistência médica em favor de quem se encontra internado ou em tratamento médico indispensável a própria sobrevivência/incolumidade.

Após o prazo de 30 (trinta) dias do nascimento, o neonato submetido a tratamento terapêutico e não inscrito no plano de saúde deve ser considerado usuário por equiparação, o que acarreta o recolhimento de quantias correspondentes a mensalidades de sua categoria. STJ. REsp 1.953.191-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/02/2022, DJe 23/02/2022 (info 727).

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