Conceitos necessários:
Serviços notariais e de registro: São atividades exercidas em caráter privado, por delegação do Poder Público, conforme o art. 236 da Constituição Federal.
Acumulação de especialidade: Ocorre quando uma serventia extrajudicial passa a exercer mais de uma função notarial ou de registro.
Desacumulação: Processo pelo qual uma função notarial ou de registro é retirada de uma serventia e atribuída a outra.
Serventia economicamente inviável: Cartório que não gera receita suficiente para se manter de forma independente, conforme previsto no art. 26, parágrafo único, da Lei nº 8.935/1994:
Art. 26. Não são acumuláveis os serviços enumerados no art. 5º.
Parágrafo único: Poderão, contudo, ser acumulados nos Municípios que não comportarem, em razão do volume dos serviços ou da receita, a instalação de mais de um dos serviços.
Exemplo didático.
Na cidade de Arujá, em São Paulo, existia um cartório que acumulava as funções de Registro Civil das Pessoas Naturais, Interdições e Tutelas, e Tabelionato de Notas. Em uma cidade vizinha, havia um cartório exclusivo de Protesto de Letras e Títulos que se tornou economicamente inviável devido ao baixo volume de serviços.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, visando otimizar os serviços, decidiu desacumular a função de Protesto de Letras e Títulos do cartório da cidade vizinha e atribuí-la ao cartório de Arujá. Assim, o cartório de Arujá passou a se chamar “Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais, Interdições e Tutelas e Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Sede da Comarca de Arujá.
A atribuição da nova especialidade (Protesto de Letras e Títulos) ao cartório de Arujá, que já exercia outras funções, é constitucional, mesmo que o titular não tenha prestado concurso específico para a nova função?
É constitucional a acumulação de especialidade em serventia preexistente nos casos de distribuição de nova função notarial ou de registro a um cartório já existente e cuja função era antes exercida por outra serventia (“desacumulação”), desde que o delegatário tenha sido habilitado, em concurso público, para uma das atividades notariais ou de registro.
O texto constitucional dispõe que o ingresso nas atividades notariais e de registro deve ocorrer por meio de delegação a quem estiver habilitado em concurso público de provas e títulos.
Nesse contexto, o Poder Judiciário local possui plena autonomia para reestruturar os serviços objeto de delegação estatal, desde que assegure a habilitação do serventuário por concurso público, em qualquer de suas modalidades (ingresso ou remoção). A observância dessa regra não prejudica nem impede que os serviços extrajudiciais sejam reorganizados em caso de vacância de serventia economicamente inviável (Lei nº 8.935/1994, art. 26, parágrafo único).
Conclusão…
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou parcialmente procedente a ação para atribuir interpretação conforme ao art. 2º da Lei nº 17.939/2024 do Estado de São Paulo e, por conseguinte, estabelecer a exigência de preenchimento da vaga, mediante concurso público, da serventia desacumulada, reconhecendo inexistir qualquer violação aos preceitos constitucionais pela acumulação de especialidade em serventia preexistente, caso o delegatário tenha sido habilitado, em concurso público, para uma das atividades, na hipótese excepcional do art. 26, parágrafo único, da Lei nº 8.935/1994.
STF. ADI 7.655/SP, relator Ministro Alexandre de Moraes, julgamento virtual finalizado em 06.09.2024 (info 1149).