Entidades do Terceiro Setor.
As entidades do Terceiro Setor são organizações sem fins lucrativos que atuam em causas sociais, como Organizações Não Governamentais (ONGs), Fundações, Organizações sociais, etc. Assim, o Terceiro Setor é formado por organizações que atuam para gerar impacto positivo na sociedade, tornando-a menos desigual. As entidades em geral podem ser assim classificadas:
Primeiro Setor: Governamental;
Segundo Setor: Empresas privadas com fins lucrativos;
Terceiro Setor: Entidades sem fins lucrativos.
Organizações Sociais (OSs) e Organizações da Sociedade Civil (OSCs).
As Organizações Sociais (OSs), reguladas pela Lei nº 9.637/1998, são entidades privadas sem fins lucrativos qualificadas pelo Estado para executar serviços públicos não exclusivos em áreas como saúde, educação e cultura. Elas estabelecem contratos de gestão com o governo, podendo receber recursos públicos sem necessidade de licitação para a celebração desses contratos, desde que sigam os princípios da administração pública, tais como legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (CF/1988, art. 37). As OSs são fiscalizadas por órgãos como Tribunais de Contas e Ministério Público, que monitoram a aplicação dos recursos e o cumprimento dos contratos de gestão. Possuem maior autonomia administrativa, podendo contratar funcionários via CLT e gerir recursos de forma mais flexível, sendo amplamente utilizadas para a gestão de hospitais e centros culturais.
Já as Organizações da Sociedade Civil (OSCs), regulamentadas pelo Marco Regulatório das OSCs – Lei nº 13.019/2014, abrangem associações, fundações e outras entidades do terceiro setor, atuando de forma mais independente na execução de projetos sociais e comunitários. Quando estabelecem parcerias com o Estado, celebram Termos de Colaboração ou Termos de Fomento, obrigatoriamente por meio de chamamento público (processo de seleção similar a uma licitação), garantindo maior transparência. Além disso, diferentemente das Organizações Sociais (OSs), que dependem de qualificação estatal, as OSCs são criadas pela sociedade civil e não necessitam dessa qualificação. As OSCs são fiscalizadas pelo governo e pelos Tribunais de Contas para assegurar o uso correto de recursos públicos.
Controvérsia.
A ADI 7629/MG que questiona o procedimento descrito pela Lei nº 23.081/18 do Estado de Minas Gerais, nos arts. 15º, 16º, 17º e 19º, utilizados para transferência da gestão hospitalar da Fhemig para a iniciativa privada. A ação foi movida pelo Sind-Saúde, através da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS) e teve como relator o ministro Dias Toffoli.
A principal controvérsia era se a transferência da execução de determinados serviços de saúde para entidades do terceiro setor (como organizações sociais – OSs e organizações da sociedade civil – OSCs), nos moldes estabelecidos pela legislação estadual, violava a Constituição Federal, especialmente no que se refere à participação popular na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), prevista no art. 198, III da CF/1988.
O questionamento feito por meio da ADI era se tal modelo de gestão:
Reduziria a participação popular na gestão do SUS, contrariando o art. 198, III da CF/1988, que prevê a participação da comunidade na gestão do SUS;
Representaria uma espécie de privatização indevida dos serviços públicos de saúde, o que tornaria a norma inconstitucional.
A lei é constitucional.
O STF decidiu, por unanimidade, que a lei estadual em questão é constitucional, desde que a descentralização da execução dos serviços seja conduzida de maneira pública, objetiva e impessoal, em observância aos princípios do art. 37 da Constituição Federal e com fiscalização adequada.
Fundamentos da decisão.
O Tribunal baseou seu entendimento sobretudo nos seguintes fundamentos:
A Constituição Federal não exige um modelo único de gestão para serviços públicos não exclusivos, permitindo aos entes federativos certa autonomia para adotarem políticas de descentralização.
O STF ressaltou que não há vedação constitucional à participação de entidades do terceiro setor na execução de serviços públicos, desde que respeitados os princípios da administração pública (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência – art. 37 da CF/1988).
Precedentes: O STF já havia decidido, em casos anteriores (ADI 1.923, ADI 4.197 e Tema 698 do RE 684.612), que a delegação de serviços não exclusivos a entidades do terceiro setor é constitucional.
A fiscalização e o controle social continuam garantidos, mesmo sem a participação popular direta nas decisões.
Tema 698/STF.
A decisão está em consonância com o precedente fixado no Tema 698/STF.
#Tese de Repercussão Geral – Tema 698-STF:
1. A intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas voltadas à realização de direitos fundamentais, em caso de ausência ou deficiência grave do serviço, não viola o princípio da separação dos poderes.
2. A decisão judicial, como regra, em lugar de determinar medidas pontuais, deve apontar as finalidades a serem alcançadas e determinar à Administração Pública que apresente um plano e/ou os meios adequados para alcançar o resultado.
3. No caso de serviços de saúde, o déficit de profissionais pode ser suprido por concurso público ou, por exemplo, pelo remanejamento de recursos humanos e pela contratação de organizações sociais (OS) e organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP).
Remanescem mecanismos de controle social.
O próprio modelo de descentralização adotado pela lei mineira não exclui mecanismos de controle social, apenas os reorganiza. Assim, a participação da sociedade na gestão do SUS não se dá apenas pela administração direta do serviço, mas também por meio de:
Regras de seleção pública das entidades responsáveis pela execução dos serviços.
Controle exercido pelo Tribunal de Contas do Estado e pelo Ministério Público, que fiscalizam a correta aplicação das verbas públicas transferidas para essas entidades privadas sem fins lucrativos.
A descentralização prevista pela Lei Estadual não se confunde com privatização de serviços públicos.
O fato de entidades do terceiro setor exercerem certas funções da administração pública não significa que o Estado está abdicando de sua responsabilidade na prestação do serviço.
O Estado continua como regulador e fiscalizador central da execução dos serviços, bem como a lei exige que todo o processo seja pautado por publicidade, impessoalidade e transparência, o que impede favorecimentos indevidos e garante o respeito aos princípios constitucionais.
Interpretação conforme à Constituição.
O STF julgou parcialmente procedente a ADI, apenas para conferir interpretação conforme a Constituição. Ou seja, a lei mineira é válida, mas deve ser aplicada com a garantia de transparência, imparcialidade, controle público e respeito aos princípios da administração pública.
A descentralização da execução dos serviços públicos não exclusivos para entidades do terceiro setor é constitucional, desde que seja feita com critérios objetivos e impessoais e sob fiscalização do Ministério Público e do Tribunal de Contas.
STF. ADI 7.629/MG, relator Ministro Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 14.02.2025 (info 1165).