Interpretação conforme a Constituição.
A interpretação conforme a Constituição é uma técnica de controle de constitucionalidade usada pelo Poder Judiciário, especialmente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), para preservar a validade de uma norma ao interpretar seu conteúdo de modo que esteja em conformidade com a Constituição.

Ou seja, quando há múltiplas interpretações possíveis para um dispositivo legal, o tribunal opta por aquela que esteja de acordo com os princípios e regras da Constituição, em vez de simplesmente declarar a norma inconstitucional. Isso evita a anulação de leis quando ainda é possível interpretá-las de maneira compatível com a Constituição.

Não é possível aplicar a técnica da interpretação conforme a Constituição quando não houver multiplicidade de interpretações válidas.
A jurisprudência desta Corte não aplica a técnica de atribuição de interpretação conforme a Constituição quando o dispositivo impugnado não comporte mais de uma exegese.

Contexto normativo.
A gira em torno do artigo 46 da Lei nº 9.504/1997, que trata da participação de candidatos em debates eleitorais transmitidos por emissoras de rádio e televisão. O dispositivo estabelece que as emissoras apenas são obrigadas a convidar para os debates candidatos de partidos que possuam um número mínimo de parlamentares eleitos no Congresso Nacional. Vejamos o contexto normativo:

Lei nº 13.165/2015: exigia no mínimo 9 parlamentares para que o partido do candidato tivesse direito obrigatório de participação nos debates.
Lei nº 13.488/2017: reduziu esse número para 5 parlamentares.

O que o STF já decidiu sobre o tema?
O Supremo já havia julgado a exigência de 9 parlamentares (regra da Lei nº 13.165/2015) como constitucional em ações anteriores (ADI 5423, ADI 5491 e ADI 5577, julgadas em 2016).

O art. 46 da Lei nº 9.504/97 é constitucional.
É constitucional o art. 46 da Lei nº 9.504/97, com redação dada pela Lei nº 13.165/2015, que prevê que as emissoras de rádio e TV somente são obrigadas a convidar para participar dos debates eleitorais os candidatos dos partidos que tenham representação na Câmara superior a 9 Deputados Federais. Esta regra não viola os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
STF. Plenário. ADI 5423/DF e ADI 5491/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgados em 24 e 25/8/2016; ADI 5577 MC-Ref/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 24 e 25/8/2016 (Info 836).

Ou seja, o STF já tinha decidido que essa regra mais restritiva (exigindo 9 parlamentares) era válida e não violava a Constituição. Assim, embora a Lei nº 13.488/2017 tenha reduzido o quantitativo mínimo de parlamentares (de 9 para 5), este Tribunal já assentou a constitucionalidade do dispositivo impugnado em sua redação anterior (dada pela Lei nº 13.165/2015), isto é, de regra mais restritiva do que a vigente atualmente.

Exemplo didático.
Suponha que o Partido X tinha apenas 4 deputados na data da convenção partidária, o que, segundo a regra, não garantiria a participação de seu candidato (Arlindo) nos debates. Porém, entre a data da convenção partidária e o primeiro debate, um deputado de outro partido migrou para o Partido X, fazendo com que ele passasse a ter 5 deputados.

O Partido Z, entretanto, impugnou a participação de Arlindo no debate promovido pela Emissora ABC, alegando que, conforme o art. 46 da Lei nº 9.504/97, o Partido X precisaria ter no mínimo 5 deputados até a data da convenção partidária.

A impugnação da participação de Arlindo no debate deverá prosperar?
Não. É inadequada e esbarra na vedação de o Poder Judiciário atuar como legislador positivo a pretensão de se conferir interpretação conforme a Constituição ao caput do art. 46 da Lei 9.504/1997, no sentido de que o momento de aferição do número de parlamentares, para fins de debates eleitorais transmitidos por emissoras de rádio ou de televisão, passe a ser a data final do período das convenções partidárias.

A Lei nº 13.488/2017 não previu qualquer marco temporal específico para entrar em vigor.
Na espécie, o conteúdo atual não revela qualquer marco temporal específico para efeito de aferição da quantidade mínima de parlamentares federais, motivo pelo qual a almejada interpretação não se insere no âmbito hermenêutico possível, sob pena de representar medida incompatível com a literalidade do artigo.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, converteu a apreciação da medida cautelar em julgamento de mérito, conheceu parcialmente da ação e, nessa extensão, a julgou improcedente para assentar a constitucionalidade do caput do art. 46 da Lei nº 9.504/1997.
STF. ADI 7.698/DF, relator Ministro Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em 21.02.2025 (info 1166).

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Área de Membros

Escolha a turma que deseja acessar: