Lei nº 12.910/2013 do Estado da Bahia.
A Lei nº 12.910/2013 do Estado da Bahia trata sobre a certificação de reconhecimento e de regularização fundiária através do contrato de concessão de direito real de uso de área, a ser celebrado com associação comunitária por meio de instrumento público.
Tais áreas, nos termos da lei, deverá ser integrada por todos os seus reais ocupantes, e, após certificadas, serão gravadas com cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade e imprescritibilidade.
Ocorre que a lei prevê um prazo máximo para o protocolo do pedido de certificação de reconhecimento e de regularização fundiária. Vejamos: “Art. 3º, §2º Os contratos de concessão de direito real de uso de que trata esta Lei serão celebrados com as associações que protocolizem os pedidos de certificação de reconhecimento e de regularização fundiária, nos órgãos competentes, até 31 de dezembro de 2018”.
É constitucional a previsão de prazo final os grupos tradicionais que vivem de pastoreio comunal em áreas rurais protocolem requerimentos de certificação de reconhecimento e de regularização fundiária de seus territórios?
Não. É inconstitucional — por ser incompatível com a proteção territorial devida às comunidades tradicionais — norma de lei estadual que fixa prazo final para que fundos e fechos de pasto (grupos tradicionais que vivem de pastoreio comunal em áreas rurais) protocolem requerimentos de certificação de reconhecimento e de regularização fundiária de seus territórios.
Deve-se garantir a proteção à propriedade coletiva, com a preservação cultural das comunidades tradicionais.
Conforme jurisprudência desta Corte, é reconhecida a central importância da tutela dos direitos territoriais dos povos e comunidades territoriais, assentada no elo entre a existência comunitária de sua cultura e das terras que ocupam. Desse modo, deve-se garantir a proteção à propriedade coletiva, com a preservação cultural das comunidades tradicionais, sob pena de condená-las ao desaparecimento e de impor-lhes a assimilação a modo de vida predominante diverso.
Convenção 169 da OIT (arts. 13 e 14) e do Pacto de São José da Costa Rica (art. 21).
Os compromissos firmados pelo Brasil, como signatário da Convenção 169 da OIT (arts. 13 e 14) e do Pacto de São José da Costa Rica (art. 21), impõem a preservação da cultura hegemônica do uso comunitário da terra e das tradições e práticas sociais de importância histórica das referidas comunidades. Nesse contexto, negar a garantia às terras tradicionalmente ocupadas configura negativa à própria identidade desses grupos do sertão baiano.
A medida prevista na lei estadual impugnada revela-se inadequada, desnecessária e desproporcional.
Ademais, a medida prevista na lei estadual impugnada revela-se inadequada, desnecessária e desproporcional, pois, além de não contribuir para a cessação dos conflitos fundiários e para a pacificação das relações sociais, implica na ameaça de extinção do pluralismo e da diversidade cultural, em inobservância a diversos preceitos da Constituição Federal de 1988.
Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, julgou procedente a ação, para declarar a inconstitucionalidade do § 2º do art. 3º da Lei 12.910/2013 do Estado da Bahia.
STF. ADI 5.783/BA, relatora Ministra Rosa Weber, julgamento finalizado em 6.9.2023 (info 1107).