Conceitos Necessários.
Recuperação Judicial: A recuperação judicial é um processo previsto na Lei nº 11.101/2005, que visa possibilitar a superação da crise econômico-financeira de uma empresa. O principal objetivo é preservar a empresa, os empregos e os interesses dos credores. Conforme o artigo 47 da referida lei:
Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

Assembleia Geral de Credores: A assembleia geral de credores é o órgão deliberativo no processo de recuperação judicial, onde os credores se reúnem para decidir sobre o plano de recuperação e outras questões relevantes. Segundo o artigo 35, I, a, da Lei nº 11.101/2005:
Art. 35. A assembleia-geral de credores deliberará sobre:
I. na recuperação judicial:
a) aprovação, rejeição ou modificação do plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor.

Descumprimento do Plano de Recuperação Judicial: O descumprimento do plano de recuperação judicial, conforme os artigos 61, § 1º, e 73, IV, da Lei nº 11.101/2005, pode levar à conversão da recuperação judicial em falência:
Art. 61. Proferida a decisão prevista no art. 58 desta Lei, o juiz poderá determinar a manutenção do devedor em recuperação judicial até que sejam cumpridas todas as obrigações previstas no plano que vencerem até, no máximo, 2 (dois) anos depois da concessão da recuperação judicial, independentemente do eventual período de carência. (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 24/12/2020)
§ 1º Durante o período estabelecido no caput deste artigo, o descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano acarretará a convolação da recuperação em falência, nos termos do art. 73 desta Lei.
Art. 73. O juiz decretará a falência durante o processo de recuperação judicial:
IV. por descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação, na forma do § 1º do art. 61 desta Lei.

Exemplo Didático.
A empresa ABC Ltda., em crise financeira, entrou com um pedido de recuperação judicial, que foi concedido pelo juiz. Em assembleia geral, os credores aprovaram um plano de recuperação que estipulava diversas obrigações para a empresa. Dentre as cláusulas aprovadas, estava uma que previa que permitia a convocação de uma nova assembleia geral caso houvesse descumprimento de obrigações, antes de qualquer conversão automática em falência.

No entanto, seis meses após a aprovação do plano, a ABC Ltda. deixou de cumprir uma das obrigações. Diante desse descumprimento, um dos credores pediu ao juiz que convertesse a recuperação judicial em falência, conforme previsto nos artigos 61, § 1º, e 73, IV, da Lei nº 11.101/2005.

É válida a cláusula que permite a convocação de uma nova assembleia geral de credores em caso de descumprimento do plano de recuperação judicial, em vez da imediata conversão em falência?
Sim. É válida a cláusula que possibilita nova convocação da assembleia geral de credores em caso de descumprimento do plano de recuperação judicial, em vez da imediata conversão em falência.

Controvérsia.
A controvérsia jurídica envolve a legalidade de cláusulas que preveem a convocação de uma nova assembleia geral de credores caso seja descumprido o plano de recuperação judicial, em vez da imediata conversão em falência.

As instâncias de origem afirmaram que a previsão de nova assembleia geral de credores violaria o estabelecido nos arts. 61, § 1º, e 73, IV, da Lei n. 11.101/2005, os quais determinam que, em caso de descumprimento de qualquer obrigação, a recuperação judicial deve ser convertida em falência.

Contudo, essas disposições não são normas imperativas, devendo ser interpretadas à luz do propósito da Lei de Recuperação Judicial, que consiste principalmente na superação da crise econômico-financeira e na preservação da empresa, conforme estabelecido em seu artigo 47.

A inserção de cláusula que possibilita nova convocação da assembleia geral, a fim de evitar o decreto imediato da falência, está inserida no âmbito da liberdade negocial dos credores.
Se os próprios credores, maiores interessados no recebimento do crédito, optam por mais uma tentativa para manter a empresa, essa decisão, firmada em assembleia, coaduna-se com os imperativos que regem a Lei de Recuperação Judicial.

Justamente por não ser a conversão em falência norma cogente, a Quarta Turma, ao julgar o AREsp n. 1.059.178/SP, entendeu ser possível a instalação de nova assembleia, em razão de alterações no quadro fático e da existência de novos elementos para elaboração de um plano de recuperação judicial efetivamente viável, a ser aprovado pelos credores.

No mais, no âmbito do processo de recuperação, é soberana a deliberação da assembleia geral de credores relativa ao conteúdo do plano. Ao magistrado compete exclusivamente a avaliação da conformidade legal do ato jurídico, fundamentado no interesse público refletido no Princípio da Preservação da Empresa e na consequente manutenção dos empregos e das fontes de produção.

A assembleia geral de credores é competente para deliberar sobre eventual alteração do plano de recuperação judicial.
Por fim, a própria Lei de Recuperação Judicial, em seu artigo art. 35, I, a, estabelece a competência da assembleia geral de credores para deliberar acerca de eventual alteração no plano de recuperação judicial.
STJ. REsp 1.830.550-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 30/4/2024 (info 811).

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