Leis municipais que proíbem o uso de linguagem neutra.
A lei nº 1.528/2021 do Município de Águas Lindas de Goiás/GO proíbe o uso da “linguagem neutra” ou “dialeto não binário” na grade curricular e no material didático de instituições de ensino públicas e privadas, em documentos oficiais das instituições de ensino, em editais de concursos públicos, e em ações culturais, esportivas, sociais ou publicitárias que recebem verba pública.
A lei garante aos estudantes o direito ao aprendizado da língua portuguesa conforme as normas estabelecidas pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) e pela gramática oficial da reforma ortográfica. A violação dessas disposições acarretará sanções para as instituições de ensino e profissionais de educação que infringirem a lei. As Secretarias responsáveis pelo ensino básico são incumbidas de valorizar a língua portuguesa culta em suas políticas educacionais.
No mesmo sentido a Lei nº 2.342/2022 do Município de Ibirité/MG também assegura aos integrantes da comunidade escolar o aprendizado da língua portuguesa de acordo com a norma culta estabelecida pelo VOLP e pelo Acordo Ortográfico de 1990. A lei proíbe terminantemente a aplicação e o ensino da “linguagem neutra” ou “dialeto não binário” em todas as atividades pedagógicas, culturais, desportivas, assistenciais e publicitárias no âmbito das instituições de ensino públicas e privadas.
Pela lei, a administração pública municipal também é proibida de usar e promover a “linguagem neutra”.
Por fim, a lei do Município de Ibirité/MG também prevê que a violação das normas resultará em sanções administrativas para agentes públicos e penalidades para instituições privadas, que incluem advertências, multas, suspensão ou cassação do alvará de funcionamento, e proibição de contratar com o poder público.
As leis são constitucionais?
Em sede cautelar, o STF suspendeu os efeitos das leis municipais que proíbem o uso de “linguagem neutra” ou “dialeto não binário” nas escolas e na Administração Pública em geral, por extrapolarem a competência suplementar reconhecida aos municípios.
Competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional.
A competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional impede que leis estaduais, distritais ou municipais estabeleçam regras gerais sobre ensino e educação e tratem de currículos, conteúdos programáticos, metodologias de ensino ou modos de exercício da atividade docente. Aos entes federativos subnacionais compete apenas editar regras e condições específicas para a adequação da lei nacional à realidade local (CF/1988, arts. 24, IX, §§ 1º ao 4º; e 30, II).
A lei extrapola a competência suplementar dos municípios.
Na espécie, as leis municipais impugnadas, ao disporem sobre a proibição da “linguagem neutra” ou “dialeto não binário” nas escolas e na Administração Pública em geral, extrapolaram a competência suplementar reconhecida aos municípios. Desse modo, houve uma inequívoca ingerência do Poder Legislativo municipal no currículo pedagógico das instituições de ensino vinculadas ao Sistema Nacional de Educação e, por conseguinte, submetidas à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996), a qual impõe a observância dos princípios da liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, além do pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas e da promoção humanística, científica e tecnológica do País.
Conclusão…
Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, em apreciação conjunta, referendou a decisão que suspendeu os efeitos da Lei nº 1.528/2021 do Município de Águas Lindas de Goiás/GO, bem como a decisão que suspendeu os efeitos da Lei nº 2.342/2022 do Município de Ibirité/MG.
STF. ADPF 1.150 MC-Ref/GO, ADPF 1.155 MC-Ref/MG, relator Ministro Alexandre de Moraes, julgamento virtual finalizado em 10.06.2024 (info 1140).
Em igual sentido:
#Tese fixada na ADI 7.019/RO: Norma estadual que, a pretexto de proteger os estudantes, proíbe modalidade de uso da língua portuguesa viola a competência legislativa da União.
STF. ADI 7.019/RO, relator Ministro Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 10.2.2023 (info 1082).
Obs.: A lei nº 5.123/2021 de Rondônia proibia o uso de “linguagem neutra” na grade curricular e no material didático de instituições de ensino públicas ou privadas, assim como em editais de concursos públicos.