Caso concreto.
José propôs ação trabalhista em face da Empresa X, ação esta julgada improcedente. Clotilde, advogada de José, apresentou o Recurso Ordinário. Ao analisar o recurso, Adolfo (juiz da causa), se sentiu ofendido com trechos da petição. Vejamos alguns trechos:
“(…) Contrariando dispositivo constitucional presente no art. 5°, XLV, o i magistrado, de forma leviana, considerou que a mera existência de poderes outorgados nos autos aos advogados constituídos na procuração e substabelecimento bastaria para todos fossem considerados partícipes no mirabolante enredo criado por sua fértil imaginação (…).

(…) Ao divagar em área jurídica da qual o i. magistrado não é especialista, esqueceu Sua Excelência do comezinho princípio que a responsabilidade penal é sempre PESSOAL (…)

(…) Assim, espantosamente, não se acanhou o MM. Juiz de 1° Grau em tentar enlamear a honra de diversos advogados lançando mão da repudiada responsabilidade objetiva (…)

(…) De fato, o raciocínio do MM. Juiz é tão absurdo e permissivo que seria o mesmo que supor que a conduta de um hipotético magistrado que tratasse as partes com truculência, deboche, ironia, parcialidade, arrogância, que conduzisse suas audiências com displicência, que reconhecesse a existência de fatos em sentença que não encontram suporte fático nos autos e ainda que imputasse às partes conduta criminosa em evidente denunciação caluniosa, pudesse ser também estendida a todo os demais magistrados que poderiam atuar no mesmo processo (…)

(…) Ressalte-se que a narrativa acima é hipotética e de cunho retórico, ou seja, busca apenas ilustrar o absurdo encontrado na r. sentença. Por óbvio não se está aqui fazendo referência ao i. Juiz a quo – devendo-se acreditar que os erros grosseiros cometidos por Sua Excelência não passaram disto, ou seja, constituem meros equívocos por ele cometidos em um momento não muito feliz de sua atuação profissional (…)” (grifos no original) (fls. 04/05)

Por este motivo, o juiz propôs ação indenizatória em face da advogada.

Excessos cometidos pelo advogado não podem ser cobertos pela imunidade profissional, sendo em tese possível a responsabilização civil ou penal do causídico pelos danos que provocar no exercício de sua atividade.
A Constituição Federal, na segunda parte do seu art. 133, ilumina a interpretação das normas federais infraconstitucionais, dispondo que o advogado é “inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. A necessária inviolabilidade do profissional da advocacia encontra naturalmente seus limites na própria lei, sendo a norma do art. 133 da Constituição Federal de eficácia redutível.

O ordenamento jurídico, aí incluindo-se o Estatuto da Advocacia, dá o tom e a medida dessa prerrogativa, pois a Constituição Federal não alcançou ao advogado um salvo conduto de indenidade, estando a prerrogativa voltada a um profícuo exercício de sua atividade essencial à prestação da Justiça, não se podendo daí desbordar a sua inviolabilidade.

O Estatuto da Advocacia fez descriminar que a inviolabilidade configura-se mediante o sigilo profissional (art. 7º, II e XIX e §6º) e enquanto imunidade penal (art. 7º, §§2º e 3º).

Trata-se a imunidade de um instrumento para garantir a efetividade da atuação do advogado na tutela dos interesses do seu cliente, não de uma licença para ofender em situações em que o advogado não esteja desempenhando a advocacia.

No caso concreto, entretanto, o pedido do juiz foi improcedente.
A par do destempero verificado na hipótese, ele o fora no contexto da impugnação elaborada contra a sentença prolatada, razão por que não existe espaço para o reconhecimento de dano moral indenizável. Assim, apesar de desconfortáveis, as imprecações não se avolumaram em intensidade a ponto de ferir-se o plano da dignidade do magistrado. STJ. REsp 1.731.439-DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/04/2022, DJe 08/04/2022 (info 731).

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