Caso concreto.
Caio está sendo acusado de agredir Ana, sua esposa, motivo pelo qual de imediato foi fixada medida protetiva o proibindo de aproximar-se da suposta vítima.
Caio, entretanto, alega inocência, bem como entende que a medida foi fixada de forma ilegal, posta que, segundo alega, não foi devidamente fundamentada, bem como nenhum dos motivos alegados encontra comprovação fática.
É possível que Caio impetre habeas corpus em virtude da medida protetiva aplicada?
Sim.
Qual a natureza jurídica das medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha?
Quanto à distinção entre a natureza cível e a natureza criminal das medidas protetivas, a jurisprudência desta Corte Superior, há muito, posiciona-se no sentido de que aquelas previstas no art. 22, incisos I, II e III, da Lei n. 11.340/2006 são de natureza criminal. Já as dispostas nos demais incisos desse dispositivo têm natureza cível:
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
(…)
IV. restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V. prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
VI. comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação; e (Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)
VII. acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio. (Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)
Já as medidas protetivas dos incisos I, II e III do art. 22 da Lei n. 11.340/2006, possuem natureza penal.
Perceba-se que tais medidas interferem no direito de locomoção. Vejamos:
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I. suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II. afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III. proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
Efeitos do reconhecimento da natureza penal das cautelares do art. 22, I, II e III, da Lei Maria da Penha.
Reconhecer a natureza penal das medidas cautelares dos incisos I, II e III do art. 22 da Lei Maria da Penha traz uma dúplice proteção:
• De um lado, protege a vítima, pois concede a ela um meio célere e efetivo de tutela de sua vida e de sua integridade física e psicológica, pleiteada diretamente à autoridade policial, e reforçada pela possibilidade de decretação da prisão preventiva do suposto autor do delito;
• De outro lado, protege o acusado, porquanto concede a ele a possibilidade de se defender da medida a qualquer tempo, sem risco de serem a ele aplicados os efeitos da revelia.
Havendo lesão ao direito de locomoção, é possível impetrar habeas corpus.
Se o paciente não pode aproximar-se a menos de 500m da vítima ou de seus familiares, se não pode aproximar-se da residência da vítima, tampouco pode frequentar o local de trabalho dela, decerto que se encontra limitada a sua liberdade de ir e vir. Posto isso, afigura-se cabível a impetração do habeas corpus, de modo que a indagação do paciente merecia uma resposta mais efetiva e assertiva. STJ. HC n. 298.499/AL, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 1/12/2015, DJe de 9/12/2015.
Eventual descumprimento das medidas protetivas pode, inclusive, resultar em prisão preventiva.
O eventual descumprimento de medidas protetivas arroladas na Lei Maria da Penha pode gerar sanções de natureza civil (art. 22, § 4º, da Lei nº 11.340/2006 c/c art. 461, §§ 5º e 6º, do Código de Processo Civil, bem como a decretação de prisão preventiva (art. 313, III, do Código de Processo Penal). Ademais, a lei adjetiva penal prevê: “Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar”. STJ. HC n. 298.499/AL, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 1/12/2015, DJe de 9/12/2015.