Caso concreto.
Carla e Mariano eram companheiros, bem como são pais de Thiago, criança de dois anos de idade. Mariano praticou inúmeras agressões em face de Carla, o que a levou a buscar socorro junto à Delegacia da Mulher.

A Juíza do Juizado Especializado em Violência Doméstica, ao conhecer do caso, de imediato fixou medidas protetivas. Ocorre que Mariano, apesar das medidas protetivas fixadas, passou a perseguir Carla, causando verdadeiro temor pela sua vida e integridade física.

Carla, então, resolveu retornar ao seu país de origem (Bolívia) com Thiago. Requereu, então, ao juízo do Juizado Especializado em Violência Doméstica suprimento a autorização paterna para retirar a criança do país.

O Juizado Especializado em Violência Doméstica é competente para conhecer do pedido?
Sim. O art. 14 da Lei n. 11.340/2006 preconiza a competência cumulativa (criminal e civil) da Vara Especializada da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para o julgamento e execução das causas advindas do constrangimento físico ou moral suportado pela mulher no âmbito doméstico e familiar.

A amplitude da competência conferida pela Lei n. 11.340/2006 à Vara Especializada tem por propósito justamente permitir ao mesmo magistrado o conhecimento da situação de violência doméstica e familiar contra a mulher, permitindo-lhe bem sopesar as repercussões jurídicas nas diversas ações civis e criminais advindas direta e indiretamente desse fato. Providência que a um só tempo facilita o acesso da mulher, vítima de violência familiar e doméstica, ao Poder Judiciário, e confere-lhe real proteção.

O pedido deve ter por fundamento a ocorrência de violência doméstica, bem como as medidas aplicáveis não se esgotam nas expressamente previstas em lei.
Para o estabelecimento da competência da Vara Especializada da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher nas ações de natureza civil (notadamente, as relacionadas ao Direito de Família), imprescindível que a correlata ação decorra (tenha por fundamento) da prática de violência doméstica ou familiar contra a mulher, não se limitando, assim, apenas às medidas protetivas de urgência previstas nos arts. 22, incisos II, IV e V; 23, incisos III e IV; e 24, que assumem natureza civil. Tem-se, por relevante, ainda, para tal escopo, que, no momento do ajuizamento da ação de natureza cível, seja atual a situação de violência doméstica e familiar a que a demandante se encontre submetida, a ensejar, potencialmente, a adoção das medidas protetivas expressamente previstas na Lei n. 11.340/2006, sob pena de banalizar a competência das Varas Especializadas.

Em atenção à funcionalidade do sistema jurisdicional, a lei tem por propósito centralizar no Juízo Especializado de Violência Doméstica Contra a Mulher todas as ações criminais e civis que tenham por fundamento a violência doméstica contra a mulher, a fim de lhe conferir as melhores condições cognitivas para deliberar sobre todas as situações jurídicas daí decorrentes, inclusive, eventualmente, a dos filhos menores do casal, com esteio, nesse caso, nos princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança e demais regras protetivas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente.

É direito da criança e do adolescente desenvolver-se em um ambiente familiar saudável e de respeito mútuo de todos os seus integrantes.
A não observância desse direito, em tese, a coloca em risco, se não físico, psicológico, apto a comprometer, sensivelmente, seu desenvolvimento. Eventual exposição da criança à situação de violência doméstica perpetrada pelo pai contra a mãe é circunstância de suma importância que deve, necessariamente, ser levada em consideração para nortear as decisões que digam respeito aos interesses desse infante. No contexto de violência doméstica contra a mulher, é o juízo da correlata Vara Especializada que detém, inarredavelmente, os melhores subsídios cognitivos para preservar e garantir os prevalentes interesses da criança, em meio à relação conflituosa de seus pais. STJ. REsp n. 1.550.166/DF, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 21/11/2017, DJe de 18/12/2017.

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