Caso concreto.
Lúcia era era mãe biológica de Mévio, que por sua vez foi adotado e registrado por outra família. No final do ano de 2019, a vítima se mudou no intuito de residir com Mévio. Após algum tempo de convivência e irritado com os cuidados necessários para zelar de sua genitora, tendo em vista tratar-se de uma idosa, ressentido pelo abandono por parte da vítima quando era criança, passou a agredir a ofendida, situação essa que se repetiu por algumas vezes.

No mês de julho de 2020, as agressões se repetiram, tendo então o denunciado desferido vários chutes e murros que acertaram a ofendida em várias partes do corpo em contexto que inviabilizou qualquer defesa da vítima. Diante das agressões, a vítima veio á óbito no local. Após o delito, o denunciado ocultou o cadáver de Lúcia, jogando a dentro de uma cisterna desativada no terreno de sua residência, sendo localizado na manhã de 29 de outubro.

Ao final, Mévio, foi condenado nos termos do artigo 121 §2°, I (motivo torpe), III (meio cruel), IV (recurso que torne impossível a defesa da vítima) e VI e §2°-A, I (feminicídio no contexto de violência doméstica e familiar), do Código Penal com as disposições da Lei º 8.072/90 e artigo 211 (ocultação de cadáver), do Código Penal.

Na segunda fase da dosimetria, o juiz aplicou a agravante do “contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge”, nos termos do art. 61, II, “e”, do CP. A defesa de Mévio, entretanto, alega que a aplicação de tal agravante importa em bis in idem já que a qualificadora do feminicídio foi aplicada em virtude do contexto de violência doméstica e familiar.

Em apelação, o Tribunal de Justiça manteve a decisão nos seguintes termos:

A incidência da mencionada qualificadora reclama somente situação de violência praticada contra a mulher, em contexto caracterizado por relação de poder e submissão, praticada por homem ou mulher sobre mulher em situação de vulnerabilidade.
In casu, ao contrário do que alegado pela defesa, não caracteriza bis in idem o reconhecimento da qualificadora do feminicídio, uma vez que vai incidir sempre que o crime estiver atrelado à violência doméstica e familiar propriamente dita, com a agravante da ascendência, já que possuem elementares e naturezas jurídicas diversas.
A agravante da ascendência apenas eleva a punição pela insensibilidade moral do agente, já que viola o dever de apoio mútuo existente entre parentes, sendo perfeitamente aplicada no delito de feminicídio.

É possível a aplicação da agravante do art. 61, II, “e”, do CP no caso?
Sim. A individualização da pena é submetida aos elementos de convicção judiciais acerca das circunstâncias do crime, cabendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, a fim de evitar eventuais arbitrariedades.
Dessarte, salvo flagrante ilegalidade, o reexame das circunstâncias judiciais e os critérios concretos de individualização da pena mostram-se inadequados à estreita via do recurso, pois exigiriam revolvimento probatório.
STJ. AgRg no REsp n. 2.007.613/TO, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 10/3/2023.

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