Controvérsia.
A controvérsia consiste em saber se, tendo falecido o executado e inexistindo notícia sobre a abertura formal de inventário, a citação do espólio na figura do administrador provisório pressupõe que a exequente diligencie antes a real e concreta situação do devedor.

Exemplo didático.
Imagine que Pedro faleceu, deixando uma série de bens e uma dívida significativa com a Fazenda Pública. Pedro era casado com Ana, e eles não tinham filhos. Após o falecimento de Pedro, sua família ainda não iniciou o processo formal de inventário.

A Fazenda Pública, interessada em recuperar a dívida, precisa citar o espólio de Pedro. No entanto, como ninguém iniciou o inventário, não há um inventariante formalmente nomeado para representar o espólio. Nesse contexto, o Estado decide pedir a citação de Ana como administradora provisória do espólio, uma vez que ela era casada com Pedro e continua residindo na casa que dividiam.

De acordo com o artigo 1.797, I, do Código Civil, até que um inventariante seja compromissado, a administração da herança cabe, sucessivamente, ao cônjuge ou companheiro. Isso permite que Ana, na ausência de um inventário formal, atue como representante do espólio para lidar com questões judiciais, como a dívida com a Fazenda Pública.

Código Civil.
Art. 1.797. Até o compromisso do inventariante, a administração da herança caberá, sucessivamente:
I. ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão;
II. ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais de um nessas condições, ao mais velho;
III. ao testamenteiro;
IV. a pessoa de confiança do juiz, na falta ou escusa das indicadas nos incisos antecedentes, ou quando tiverem de ser afastadas por motivo grave levado ao conhecimento do juiz.

Somente seria possível promover a citação na forma do art. 1.797, I, do CC se a Fazenda comprovasse a inexistência de inventário.
No caso, a Corte Regional compreendeu que, somente seria possível promover a citação na forma do art. 1.797, I, do CC (até o compromisso do inventariante, a administração da herança caberá, sucessivamente, ao cônjuge ou companheiro, se com o outro convivia ao tempo da abertura da sucessão […]) se a Fazenda comprovasse a inexistência de inventário.

O referido dispositivo (art. 1.797, I, do CC) tem como um dos principais propósitos facilitar a representação formal do espólio até que efetivamente se tenha notícia da abertura do inventário, de modo que exigir a confirmação da inexistência deste (do inventário) como requisito para citação do administrador provisório vai à contramão da norma, violando-a. Nas execuções, basta que não haja confirmação da abertura de inventário e da nomeação de inventariante para se admitir, a pedido da parte interessada, a citação do administrador provisório como representante processual do espólio/herança, conforme dispõem os arts. 613, 614 e 796 do CPC e o art. 1.797, I, do CC.

Ao pedir a citação do administrador provisório sem verificar se há inventário aberto, o autor da ação assume o risco.
Nesses casos, porém, a parte exequente assume o ônus de ver o ato de citação ser considerado viciado, se restar futuramente demonstrado que já existia inventário formal aberto (com a nomeação de inventariante) no momento da realização da comunicação do administrador provisório; isto é, compete ao exequente gerenciar esse risco processual, de modo a, anteriormente, diligenciar a existência de abertura de inventário, ou, querendo, assumir o ônus de requerer de imediato a citação do administrador provisório, sabendo que esse ato de comunicação pode vir a ser considerado inválido.
STJ. REsp n. 1.925.285/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 19/9/2023, DJe de 24/10/2023.

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