Doação inoficiosa.
A doação inoficiosa ocorre quando uma pessoa faz doações em vida que excedem a parte do seu patrimônio que poderia dispor livremente, ou seja, a metade que não constitui a legítima. Se as doações feitas em vida pelo doador excederem a parte disponível (a metade que não é a legítima), essas doações podem ser reduzidas para que a legítima dos herdeiros necessários seja preservada.
Nos termos do art. 1.845 do Código Civil, são herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge. Já nos termos do art. 1.846, a estes pertence, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.
Portanto, caso o doador tenha herdeiros necessários, ele não poderá doar mais de metade do seu patrimônio.
Em que momento deve ser verificado se a doação ultrapassou o limite que seria possível?
Deve-se avaliar a situação no momento da doação. Assim, o excesso caracterizador da doação inoficiosa deve ser considerado no momento da liberalidade e não na data de falecimento do doador nem na abertura da sucessão.
Exemplo didático para fixar.
No ano de 2010, Augusto possuía um patrimônio estimado de 20 milhões de reais. Augusto possuía apenas um herdeiro, seu filho Miguel. Ainda naquele ano, Augusto resolveu doar um imóvel avaliado em 300 mil reais ao seu amigo de infância, Davi.
No ano de 2020, Augusto passou por uma grave crise financeira, vindo a falecer em 2022 com um patrimônio de apenas 400 mil reais.
A doação realizada por Augusto a Davi pode ser considerada inoficiosa?
Não. Na esteira da sólida jurisprudência desta Corte, firmada tanto sob a ótica do art. 1.176 do CC/1916, quanto também sob a égide do art. 549 do CC/2002, o excesso caracterizador da doação inoficiosa deve ser considerado no momento da liberalidade e não no momento do falecimento do doador e da abertura da sucessão.
STJ. REsp n. 2.026.288/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18/4/2023, DJe de 20/4/2023.
Exemplo didático 2.
No ano de 2010, Augusto possuía um patrimônio estimado de 400 mil reais. Augusto possuía apenas um herdeiro, seu filho Miguel. Ainda naquele ano, Augusto resolveu doar um imóvel avaliado em 300 mil reais ao seu amigo de infância, Davi.
A doação é considerada inoficiosa? Sim.
Qual o prazo prescricional para buscar a anulação da doação? 10 anos.
Qual o termo inicial do prazo?
A data da ciência da doação, que via de regra é a data do registro da doação que se pretende anular. Na ação de nulidade de doação inoficiosa, o prazo prescricional de 10 anos é contado a partir do registro do ato jurídico que se pretende anular, salvo se houver anterior ciência inequívoca do suposto prejudicado.
Sobre o tema, no julgamento do REsp 1.755.379/RJ, concluiu-se que o entendimento segundo o qual o prazo para nulificar a doação inoficiosa deve ser contado a partir do registro do ato jurídico que se pretende anular está fundado “em um dos principais pilares norteadores do sistema registral, qual seja, o princípio da publicidade, segundo o qual o registro por si só é capaz de gerar presunção de conhecimento por todos os interessados”.
STJ. REsp 1.933.685-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 15/03/2022 (info 729).
Então não é necessário aguardar o doador falecer para propor a ação?
Isso mesmo. A ação de redução da doação inoficiosa poderá ser proposta ainda durante a vida do doador, observado o prazo prescricional que tem como termo inicial o registro do ato jurídico que se pretende anular.
Caso concreto em que houve anterior ciência inequívoca do prejudicado antes do registro e que, por isso, o termo inicial da prescrição se deu antes.
Na hipótese, existia um ato jurídico anterior ao registro da doação na matrícula do imóvel, igualmente dotado de publicidade e, mais do que isso, do qual efetivamente participou o recorrente na qualidade de interveniente-anuente. STJ. REsp 1.933.685-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 15/03/2022 (info 729).