Consentimento dos pais ou detentores do poder familiar em casos de colocação de crianças ou adolescentes em famílias substitutas.
O artigo 166 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), originalmente instituído pela Lei nº 8.069/1990, sofreu significativas alterações com o passar do tempo, especialmente pelas Leis nº 12.010/2009 e nº 13.509/2017. Este artigo regula os procedimentos relacionados ao consentimento dos pais ou detentores do poder familiar em casos de colocação de crianças ou adolescentes em famílias substitutas, com ênfase na adoção. Abaixo, segue uma explicação detalhada de cada ponto do artigo:

Requisitos para Iniciar o Pedido de Colocação em Família Substituta
O caput do artigo 166 prevê as condições sob as quais a criança pode ser colocada em uma família substituta. Os cenários são os seguintes:
Pais falecidos – Não há mais titulares do poder familiar.
Pais destituídos ou suspensos do poder familiar – Casos em que os pais perderam legalmente a autoridade parental por decisão judicial ou tiveram essa autoridade temporariamente suspensa.
Consentimento expresso para a colocação – Os pais (ou responsáveis legais) concordam, de maneira formal e manifesta, que a criança seja colocada em uma nova família.

Neste último caso, o procedimento pode ser iniciado diretamente no cartório, em uma petição assinada pelos requerentes, sem a necessidade de assistência de advogado.

Audiência de Concordância com a Intervenção do Juiz
O 1º detalha o procedimento a ser seguido quando os pais da criança concordam com a adoção:
Presença do Ministério Público: O magistrado deve realizar uma audiência para ouvir todas as partes envolvidas, garantindo a lisura do procedimento.
Assistência judicial obrigatória: Os pais e os demais envolvidos devem estar acompanhados por advogado ou defensor público, assegurando que todos os direitos sejam respeitados.
Prazo Processual: A audiência deve ocorrer no prazo máximo de 10 dias após o protocolo do pedido ou a entrega da criança ao Judiciário, demonstrando a urgência que o ordenamento jurídico atribui à garantia de um desfecho adequado e célere.
Confirmação formal (tomada de termo): Durante esse ato, o juiz verificará se o consentimento dos pais é livre, consciente e inequívoco. As declarações das partes são registradas formalmente.

Após verificar a concordância, o juiz declarará formalmente a extinção do poder familiar, ou seja, os pais biológicos deixarão de ser legalmente os responsáveis pela criança, permitindo sua colocação definitiva na família substituta.

Para assegurar que os pais compreendam o alcance do ato que estão prestes a autorizar a lei também estabelece que equipes interprofissionais, formadas, por exemplo, por psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais da equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude devem:
Explicar detalhadamente o processo.
Esclarecer que a adoção é irrevogável, ou seja, uma vez concretizada, os pais biológicos não podem mais requerer a guarda da criança.
Fornecer informações de maneira educativa para que os pais tomem essa decisão de forma consciente e informada, especialmente devido às implicações jurídicas e emocionais.

Ademais, tanto a família natural (pais ou parentes biológicos) quanto a família substituta têm direito a acompanhamento técnico especializado, assegurado pelos serviços da Justiça da Infância e da Juventude e, de preferência, pelos profissionais da rede municipal de assistência social. Esses profissionais ajudam ambas as famílias a lidar com as mudanças emocionais, sociais e legais decorrentes do processo de adoção.

Garantia da Liberdade e Sigilo
São assegurados direitos fundamentais relativos ao consentimento:
Livre manifestação de vontade: Os pais ou responsáveis legais têm o direito de decidir pela adoção de forma totalmente espontânea, sem qualquer tipo de coerção ou pressão externa.
Sigilo das informações: Este aspecto protege a privacidade das partes envolvidas, evitando a exposição pública de questões sensíveis relacionadas à adoção ou à criança.

Validade Condicionada do Consentimento por Escrito
Embora os pais possam declarar seu consentimento por escrito, este só terá validade se for ratificado em audiência judicial, conforme o § 1º. Isso serve como uma camada adicional de segurança para evitar consentimentos precipitados ou proferidos de forma imprudente.

Destaque-se que o consentimento dos pais biológicos só terá validade se for dado após o nascimento da criança. Essa regra previne consentimentos prematuros feitos durante a gravidez, garantindo que os pais não tomem decisões precipitadas ou mal fundamentadas.

Prazo para Retratação (Arrependimento).
O legislador define os prazos e condições para que os pais possam se retratar de sua decisão de consentir com a adoção:
Retratação até a audiência: Antes da audiência judicial de ratificação (§1º), os pais podem se retratar do consentimento sem maiores complicações.
Prazo de arrependimento após sentença: Caso a sentença de extinção do poder familiar já tenha sido proferida, os pais ainda possuem um prazo de 10 dias para manifestar arrependimento formal.

→ A retratação sempre impedirá o prosseguimento do processo de adoção?
Não. A retratação ao consentimento de entrega de filho para adoção, mesmo que feita antes da publicação da sentença constitutiva da adoção, não gera direito potestativo aos pais biológicos de recuperarem o infante, mas será sopesada com outros elementos para definir o melhor interesse do menor.

Caso concreto em que a adoção foi mantida:
A criança adotanda é o objeto de proteção legal primário em um processo de adoção, devendo a ela ser assegurada condições básicas para o seu bem-estar e desenvolvimento sociopsicológico.

À luz desse comando principiológico, a retratação ao consentimento de entrega de filho para adoção, mesmo que feito antes da publicação da sentença constitutiva da adoção, não gera direito potestativo aos pais biológicos de recuperarem o infante, mas será sopesado com outros elementos para se definir o melhor interesse do menor.

Apontando as circunstâncias fáticas para o significativo lapso temporal de quase 04 (quatro) anos de convívio do adotado com sua nova família, e ainda, que não houve contato anterior do infante com sua mãe biológica, tendo em vista que foi entregue para doação após o nascimento, deve-se manter íntegro o núcleo familiar. STJ. REsp n. 1.578.913/MG, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 16/2/2017, DJe de 24/2/2017.

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