Exemplo didático 1.
Lucas, adolescente, tinha uma conta com dinheiro recebido de herança, administrada por sua mãe, dona Clara. No entanto, ao longo dos anos, Lucas percebeu que sua mãe sempre dizia que não havia dinheiro para comprar materiais escolares novos ou até para pagar o transporte da escola. Por outro lado, ele via sua mãe comprando roupas caras, viajando e gastando bem mais do que sua renda permitia.
Quando Lucas completou 18 anos, ele foi ao banco para verificar sua conta e descobriu que praticamente todo o dinheiro havia sido retirado por sua mãe ao longo dos anos.
Lucas poderá propor uma ação pedindo que Clara (sua mãe) preste contas?
No caso concreto, sim. Os pais são administradores e usufrutuários dos bens dos filhos menores e têm legitimidade para levantar valores depositados em prol destes, salvo se demonstrado que a medida não atende o melhor interesse da criança ou do adolescente.
Ação de prestação de contas do filho em desfavor dos pais.
A ação de prestação de contas ajuizada pelo filho em desfavor dos pais é possível quando a causa de pedir estiver relacionada com suposto abuso do direito ao usufruto legal e à administração dos bens dos filhos. STJ. 3ª Turma. REsp 1.623.098-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 13/03/2018 (Info 622).
Perceba que a decisão acima se trata de uma situação excepcional.
Em regra os pais não precisam prestar contas aos filhos da administração dos seus bens, posto que há uma presunção legal de que tais bens e valores foram utilizados para a manutenção dos filhos.
No caso concreto, o filho alegou que, não obstante ter sofrido abandono material, sempre vivendo com dificuldades, sua mãe sacou e movimentou valores de sua conta como se fosse dela, emitindo cheques e pagando contas próprias.
Exemplo didático 2.
Orestes faleceu deixando alguns herdeiros, dentre eles sua esposa Socorro, que foi nomeada inventariante. Orestes teve um filho em um casamento anterior, Pedro, ainda menor de idade. Diante disso, a mãe de Pedro, Maria, contratou um advogado para tutelar os interesses do menor, prometendo o pagamento do equivalente a 3% de seu quinhão hereditário. O contrato é válido e exigível em face do menor?
Não se pode reconhecer, de imediato, a plena validade de todo o conteúdo material da contratação, a ponto de se lhe certificar os atributos de liquidez, certeza e exigibilidade em face do menor contratante.
O fato de ter sido concedida a gestão da herança a terceiro não implica restrição do exercício do poder familiar do genitor sobrevivente para promover a contratação de advogado, em nome dos herdeiros menores, a fim de representar os interesses deles no inventário.
É necessário verificar o caso concreto.
Em determinados contextos, a existência de sentimento antagônico, de mútua desconfiança e insegurança, entre a genitora e a administradora dos bens, é motivo suficiente a justificar a contratação, pela mãe em favor dos filhos, de advogados que pudessem acompanhar a adequada condução do inventário e a correta administração do espólio dos bens deixados por morte do genitor dos menores, verificando a existência de eventual conflito com os interesses dos herdeiros.
STJ. REsp 1.566.852-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. Acd. Min. Raul Araújo, 4ª Turma, por maioria, julgado 17/08/2021 (info 705).
O ato de contratar advogado para atuar em inventário em nome dos filhos é ato de simples administração e independe de autorização judicial.
A contratação de advogado por representante de incapaz, para atuar em inventário, como ocorre na presente hipótese, configura ato de simples administração e independe de autorização judicial. STJ. REsp 1.694.350/ES, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJe de 18/10/2018.