Impossibilidade de adoção por ascendentes e irmãos do adotando.
Conquanto a regra do art. 42, § 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, vede expressamente a adoção dos netos pelos avós, fato é que o referido dispositivo legal tem sofrido flexibilizações no STJ, sempre excepcionais, por razões humanitárias e sociais, bem como para preservar situações de fato consolidadas.
A partir do exame dos precedentes do STJ a respeito da matéria, verifica-se que os elementos que justificam a vedação à adoção por ascendentes são:
(i) a possível confusão na estrutura familiar;
(ii) problemas decorrentes de questões hereditárias;
(iii) fraudes previdenciárias; e
(iv) a inocuidade da medida em termos de transferência de amor/afeto para o adotando”.
É possível a mitigação da norma geral impeditiva contida no § 1º do artigo 42 do ECA, de modo a se autorizar a adoção avoenga em situações excepcionais.
A Quarta Turma do STJ no julgamento do REsp 1.587.477/SC, publicado em 27/8/2020, fixou requisitos para a adoção avoenga:
A unanimidade dos integrantes da Quarta Turma não controvertem sobre a possibilidade de mitigação da norma geral impeditiva contida no § 1º do artigo 42 do ECA – de modo a se autorizar a adoção avoenga – em situações excepcionais em que:
O pretenso adotando seja menor de idade;
Os avós (pretensos adotantes) exerçam, com exclusividade, as funções de mãe e pai do neto desde o seu nascimento;
A parentalidade socioafetiva tenha sido devidamente atestada por estudo psicossocial;
O adotando reconheça os adotantes como seus genitores e seu pai (ou sua mãe) como irmão;
Inexista conflito familiar a respeito da adoção;
Não se constate perigo de confusão mental e emocional a ser gerada no adotando;
Não se funde a pretensão de adoção em motivos ilegítimos, a exemplo da predominância de interesses econômicos; e
A adoção apresente reais vantagens para o adotando.
STJ. REsp 1.587.477-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 10/03/2020, DJe 27/08/2020 (info 678).
No caso concreto em que foi deferida da adoção avoenga:
No caso concreto, a adotanda residiria com a avó desde tenra idade, uma vez que abandonada em definitivo pela mãe biológica alguns meses após o nascimento e a paternidade biológica somente veio a ser reconhecida em ação investigatória post mortem.
Dessa forma, a avó mantinha a guarda da adolescente desde janeiro de 2007, tudo a sugerir a possibilidade de, em princípio, existir um vínculo socioafetivo não apenas avoengo, mas materno-filial.
Assim, foram afastados os óbices da ilegitimidade ativa e da impossibilidade jurídica do pedido, anular a sentença e determinar que seja dado regular prosseguimento ao processo, com exauriente instrução acerca da matéria.
STJ. REsp n. 1.957.849/MG, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 14/6/2022, DJe de 21/6/2022.
No caso concreto em que não foi deferida da adoção avoenga:
Exemplo didático.
Lana resolve ser mãe solo, para tanto utiliza a técnica de inseminação artificial, gerando o seu filho Enzo. Enzo atualmente reside com sua mãe Lana e seu avô materno, Edgar.
Desde pequeno, Enzo chamou Edgar de pai, bem como vê nele uma figura paterna. Por este motivo, Edgar pretende adotar o neto.
A adoção é possível?
Não. O simples fato de o neto, concebido por inseminação artificial, coabitar residência com mãe e o avô materno e reconhecê-lo como pai, não é suficiente para afastar a proibição prevista no art. 42, § 1º, do ECA, que veda a adoção por avós.
Família monoparental decorrente de inseminação artificial.
A Constituição Federal, em seu art. 226, § 4º, reconhece como entidade familiar a comunidade formada por qualquer um dos pais e seus descendentes, denominada família “monoparental”, que deve ser prestigiada, mormente quando da escolha por essa modalidade de família por pessoa que opta pela realização de inseminação artificial.
No caso concreto, não é possível a adoção avoenga.
Dessa forma, nos termos da jurisprudência do STJ, não é suficiente que a criança reconheça o avô como pai para superar o expresso óbice legal – em especial quando os demais requisitos para superação do art. 42, §1º no ECA estão ausentes. Ademais, no caso, se verifica que a mãe exerce plenamente a maternidade, sem qualquer óbice ou incapacidade, tendo inclusive desejado e planejado a gestação por técnica de reprodução assistida por inseminação artificial.
STJ. Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 5/11/2024, DJe 7/11/2024 (info 833).