Comoriência.
A comoriência é um conceito jurídico que se refere à situação em que duas ou mais pessoas falecem em um mesmo evento, sem que seja possível determinar quem morreu primeiro. Isso pode ocorrer, por exemplo, em acidentes de carro, desastres naturais ou outras circunstâncias em que várias pessoas perdem a vida simultaneamente. O instituto está previso no art. 8º do Código Civil:

Quanto à sua previsão no Código Civil brasileiro, a resposta é sim, a comoriência está prevista. Ela é abordada no artigo 8º do Código Civil de 2002, que diz:

Código Civil.
Art. 8º Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos.

Esta previsão legal é importante porque tem implicações significativas em questões de herança e sucessão. Quando não é possível determinar a ordem das mortes, a lei presume que todas ocorreram ao mesmo tempo, o que afeta a forma como os bens serão distribuídos entre os herdeiros.

Por exemplo, se um casal sem filhos morre em um acidente de carro e não é possível determinar quem morreu primeiro, não se considera que um herdou do outro. Neste caso, os bens de cada um serão distribuídos para seus respectivos herdeiros legais, como se tivessem morrido independentemente.

A comoriência é um conceito importante no direito civil e sucessório, pois evita especulações e disputas sobre a ordem das mortes em situações trágicas, proporcionando uma solução legal clara para essas circunstâncias complexas.

Direito de representação.
É um instituto do direito sucessório que permite que os descendentes de um herdeiro que faleceu antes do autor da herança ocupem o lugar deste na sucessão.

Exemplo didático.
Imagine que Antônio, um homem de 45 anos, contratou um seguro de vida, mas não especificou os beneficiários no contrato. Portanto, nesse caso, a definição dos beneficiários do seguro seguirá a ordem de vocação sucessória.

Antônio não tem ascendentes ou descendentes vivos. Tem, por outro lado, dois irmãos: Maria e Regina. Maria, por sua vez, tem dois filhos pequenos: Pedro, de 8 anos, e Ana, de 6 anos.

Antônio e Maria estavam viajando juntos quando sofreram um acidente de avião. Ambos faleceram no acidente, e não foi possível determinar quem morreu primeiro, caracterizando a comoriência.

Problemática.
Como ocorreu a comoriência, por ficção jurídica parte-se do pressuposto de que Antônio e Maria morreram simultaneamente, e, portanto, não há nenhum pré morto. Portanto, temos duas possibilidades:

Possibilidade 1: considerar que apenas Regina é herdeira e, dessa forma, atribuí-la 100% do valor do seguro.
Possibilidade 2: considerar que Pedro e Ana podem herdar por representação da mãe falecida, em concorrência com Regina.

Qual a possibilidade correta?
A possibilidade 2. Mesmo em caso de comoriência, é cabível o direito de representação para fins de identificação dos beneficiários de seguro de vida, quando o contrato é omisso e os beneficiários são definidos pela ordem de vocação sucessória.

Controvérsia.
O propósito da controvérsia é decidir se a comoriência entre o segurado e a irmã afasta o direito de representação dos filhos desta, para fins de utilização da ordem de vocação sucessória como critério para a definição dos beneficiários de seguro de vida diante da omissão do contrato.

A legislação brasileira não afasta o direito de representação no caso de comoriência.
Em momento algum, a legislação brasileira determina que a situação de mortes simultâneas por presunção (comoriência) afasta o direito de representação (ou por estirpe). E não haveria razão de assim o prever. Pois, conferir tratamento jurídico diferente a pessoas que se encontram em situações fáticas semelhantes representaria afronta ao princípio da isonomia consagrado no art. 5º da CF.

Interpretação teleológica do instituto.
É preciso interpretar o art. 1.851 e o art. 1.854 do CC de acordo com a finalidade do direito de representação, que se destina a resguardar o interesse daquele que perdeu precocemente seus genitores – seja antes ou simultaneamente à morte do autor da herança. Ainda mais quando os que pleiteiam o direito de representação são crianças e adolescentes – inseridos na condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, conforme reconhecido pelo art. 6º do ECA, e cuja proteção deve ser garantida com absoluta prioridade pela família, pela sociedade e pelo Estado (art. 227 da CF). Na mesma linha, o Enunciado n. 610 da VII Jornada de Direito Civil do – CJF dispõe que:

Enunciado nº 610 da VII Jornada de Direito Civil do CJF: Nos casos de comoriência entre ascendente e descendente, ou entre irmãos, reconhece-se o direito de representação aos descendentes e aos filhos dos irmãos

Conclusão…
Portanto, o direito de representação tem lugar quando aquele que seria sucessor, se vivo fosse, mas morreu antes (pré-morte) ou simultaneamente à abertura da sucessão (comoriência), é representado por seus filhos, que recebem a herança diretamente do autor, concorrendo com parentes de grau mais próximo.
STJ. REsp 2.095.584-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 10/9/2024, DJe 12/9/2024 (info 825).

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