Exemplo Didático.
Maria tem duas dívidas fiscais distintas com o o estado do Tocantins, que motivaram a propositura de duas execuções fiscais. Na primeira execução fiscal, houve penhora de R$30.000,00 de sua conta bancária. Após a penhora, Maria pagou integralmente essa dívida.
Ocorre que, após o pagamento, o juiz verificou a pendência de outra execução fiscal envolvendo as mesmas partes (Maria e Estado do Tocantins). Por isso, ao invés de simplesmente declarar extinta a execução pelo cumprimento integral, o juiz procedeu a transferência da penhora existente para outro processo executivo envolvendo as mesmas partes.
O juiz agiu corretamente?
Não. Não há no Código de Processo Civil, nem na Lei n. 6.830/1980, regra que autorize o magistrado que extingue a execução fiscal em face do pagamento a proceder com a transferência da penhora existente para outro processo executivo envolvendo as mesmas partes.
Se, após a penhora de valores, o devedor vier a realizar o pagamento, a execução se resolve com a satisfação da obrigação (art. 924, II, do CPC/2015), devendo ser extinta.
A penhora é o ato judicial que impede o devedor de dispor de bens e/ou direitos para o fim de garantir a quitação de determinado crédito executado. Mantida a inércia do devedor depois de realizada a penhora, o juízo, por impulso oficial, passa a realizar os atos processuais tendentes à expropriação propriamente dita, com a avaliação e, posteriormente, com a adjudicação ou a alienação judicial do bem objeto da constrição.
Entretanto, se o devedor vier a realizar o pagamento, a execução se resolve com a satisfação da obrigação (art. 924, II, do CPC/2015), tendo como consequência a devolução (liberação) da garantia então existente em favor do devedor, porquanto não mais necessária para garantir aquele determinado crédito.
Código de Processo Civil
Art. 924. Extingue-se a execução quando: (…)
II. a obrigação for satisfeita;
Não há, pois, no Código de Processo Civil regra que autorize o magistrado que extingue a execução fiscal em face do pagamento a proceder com a transferência da penhora existente para outro processo executivo envolvendo as mesmas partes. A interpretação da Lei de Execução Fiscal também leva a essa mesma conclusão.
No caso concreto, não houve reunião de execuções fiscais.
Embora o art. 28 da Lei de Execução Fiscal. disponha que:
Lei nº 6.830/1980.
Art. 28. O Juiz, a requerimento das partes, poderá, por conveniência da unidade da garantia da execução, ordenar a reunião de processos contra o mesmo devedor.
…a execução tratada no caso em discussão, contudo, não foi reunida com outros feitos executivos para fins de compartilhamento da garantia.
Assim, cuidando de ação executiva processada de forma autônoma e de penhora em dinheiro, conversível em depósito (art. 11, § 2º), é de rigor a aplicação do art. 32, § 2º, o qual preconiza que:
Lei nº 6.830/1980.
Art. 32. Os depósitos judiciais em dinheiro serão obrigatoriamente feitos: (…)
§ 2º Após o trânsito em julgado da decisão, o depósito, monetariamente atualizado, será devolvido ao depositante ou entregue à Fazenda Pública, mediante ordem do Juízo competente.
Dessa forma, a LEF, como visto, não dá a opção de transferência de penhora ao magistrado, devendo ela ser liberada para a parte vencedora.
O art. 53, §2º, da Lei n. 8.212/1991 não se aplica ao caso concreto.
Destaca-se ainda que o legislador previu a subsistência da penhora após a sentença extintiva em face do pagamento para garantir outra ação executiva pendente somente às execuções fiscais da dívida ativa da União, suas autarquias e fundações públicas, consoante disposição contida no art. 53, §2º, da Lei n. 8.212/1991.
Lei nº 8.212/1991.
Art. 53. Na execução judicial da dívida ativa da União, suas autarquias e fundações públicas, será facultado ao exequente indicar bens à penhora, a qual será efetivada concomitantemente com a citação inicial do devedor. (…)
§ 2º Efetuado o pagamento integral da dívida executada, com seus acréscimos legais, no prazo de 2 (dois) dias úteis contados da citação, independentemente da juntada aos autos do respectivo mandado, poderá ser liberada a penhora, desde que não haja outra execução pendente.
Não é possível, contudo, aplicar esse dispositivo para a execução fiscal de débito inscrito na dívida ativa dos estados ou dos municípios, sob pena de indevida atuação do magistrado como legislador positivo, por caracterizar clara ofensa ao Princípio da Separação dos Poderes.
STJ. REsp 2.128.507-TO, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 23/5/202 (info 815).