Panorama do julgado.
O julgado do STJ no REsp 2.120.610-SP, relatado pela Ministra Regina Helena Costa, trata de uma controvérsia relativa à compensação de créditos acumulados de ICMS com valores devidos a título de ICMS-ST (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços por Substituição Tributária). O ponto central analisado foi se a Lei Complementar n. 87/1996 (Lei Kandir) permite essa compensação, mesmo quando a legislação estadual expressamente a veda.

Contextualização do Problema.
ICMS e sua não cumulatividade: De acordo com o art. 155, § 2º, I, da Constituição Federal, o ICMS deve obedecer ao princípio da não cumulatividade, ou seja, o valor devido em cada operação deve ser compensado com o imposto anteriormente cobrado nas operações anteriores. Essa sistemática busca evitar a tributação em cascata.
Compensação Tributária: Não confundir dois tipos distintos de “compensação”:
Compensação dentro da sistemática da não cumulatividade do ICMS: Para evitar a tributação em cascata, o contribuinte pode utilizar créditos do imposto pago nas etapas anteriores da cadeia produtiva.
Compensação como forma de extinção do crédito tributário (art. 156, II, do CTN): São situações em que um contribuinte tem valores a restituir e quer compensá-los com tributos a pagar, o que depende de autorização específica em lei.
Substituição Tributária (ICMS-ST): No regime de substituição tributária (ST), o imposto é pago antecipadamente pelo primeiro elo da cadeia (geralmente o fabricante ou importador). Esse “substituto tributário” calcula e recolhe de uma vez só o ICMS que seria devido em todas as etapas posteriores (distribuidoras, varejistas etc.).
Como o ICMS-ST já é recolhido antecipadamente, ele não se encaixa exatamente na sistemática normal da não cumulatividade.

Por que o ICMS-ST não se encaixa na sistemática tradicional da Não Cumulatividade?
A essência do ICMS é a compensação de créditos entre as fases da produção e venda, mas no ICMS-ST isso não acontece da mesma forma porque:

O imposto já foi pago antecipadamente, sem permitir uma compensação direta fase a fase.
Os atacadistas e varejistas não pagam mais ICMS sobre essas mercadorias, pois o fornecedor inicial recolheu tudo antecipadamente.
O cálculo do ICMS-ST é baseado em uma estimativa de preço futuro, enquanto o ICMS tradicional é pago sobre o preço real da operação.

Por isso, o ICMS-ST “quebra” a cadeia de compensação normal do imposto. Os contribuintes subsequentes não têm débitos de ICMS-ST a compensar, dificultando o uso de créditos acumulados de ICMS.

No caso concreto a legislação estadual expressamente veda a compensação.
O STJ analisou se a Lei Kandir permitiria a compensação de créditos acumulados de ICMS com valores devidos em ICMS-ST, ainda que uma lei estadual proibisse essa compensação e decidiu que não é possível.

Ausência de Previsão Expressa na Lei Kandir.
A Lei Complementar n. 87/1996 (Lei Kandir) traz regras para a compensação de créditos de ICMS no regime da não cumulatividade, mas não prevê expressamente a possibilidade de compensação com ICMS-ST. Ou seja, a lei complementar não autoriza essa compensação de forma clara e direta.

Necessidade de previsão expressa.
O julgamento também considerou entendimentos anteriores do STF, que já decidiram que o direito à compensação de créditos de ICMS não é absoluto. O STF entende que a Constituição permite que a legislação infraconstitucional limite esse direito, inclusive quando se trata de ICMS-ST.

Embora em tese o princípio da não cumulatividade devesse abranger todas as operações, incluindo as sujeitas à substituição tributária, o STF consolidou o entendimento de que só se pode compensar créditos nessa situação quando houver previsão expressa na lei.

A lei estadual veda expressamente essa compensação.
Além da falta de previsão na Lei Kandir, a legislação estadual analisada proibia expressamente o uso de créditos acumulados para compensação com ICMS-ST. Logo, como a Constituição permite que as leis estaduais disciplinem a forma de realização do ICMS e a substituição tributária, o STJ concluiu que a restrição imposta pela lei estadual deveria ser respeitada.

Conclusões…
A Lei Kandir não autoriza expressamente a compensação do ICMS creditado com ICMS-ST.
O STJ seguiu o entendimento do STF, segundo o qual a compensação dentro do ICMS pode ser limitada pela legislação ordinária.
Como havia vedação expressa na lei estadual, essa compensação não pode ser realizada pelo contribuinte.
A decisão favorece a segurança jurídica dos Estados, que têm o poder de estipular tais restrições na substituição tributária.
STJ. REsp 2.120.610-SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 4/2/2025, DJEN 11/2/2025 (info 841).

CUIDADO PARA NÃO CONFUNDIR!
O STF decidiu que quando o ICMS-ST for recolhido sobre uma base de calculo presumida for superior ao valor efetivo da operação final, é possível a restituição do ICMS pago à maior.
Vejamos a tese fixada:

#Tese de Repercussão Geral – Tema 201-STF: É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pago a mais, no regime de substituição tributária para a frente, se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida.
STF. Plenário. ADI 2675/PE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski e ADI 2777/SP, red. p/ o ac. Min. Ricardo Lewandowski, julgados em 19/10/2016 (Info 844).
STF. Plenário. RE 593849/MG, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em 19/10/2016 (Info 844).

A tese do Tema 201 da Repercussão Geral do STF trata da restituição do ICMS-ST pago a mais quando a base de cálculo presumida for superior à base de cálculo real da operação. No entanto, o julgamento do REsp 2.120.610-SP discute a possibilidade de compensar créditos acumulados de ICMS normal com ICMS-ST, o que são questões distintas.

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