Competência para julgar o crime de estelionato praticado mediante depósito frustrado?
Como era antes da Lei nº 14.155/2021? A competência era do Juízo onde se auferiu a vantagem ilícita em prejuízo da vítima – o local onde se situava a conta que recebeu os valores depositados.
Com a Lei nº 14.155/2021, qual passou a ser a competência? A competência do Juízo do domicílio da vítima.

Competência para julgar o crime de estelionato praticado mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundo.
Como era antes da Lei nº 14.155/2021? Compete ao foro do local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos.
Com a Lei nº 14.155/2021, qual passou a ser a competência? A competência do Juízo do domicílio da vítima.

O art. 70, §4º do CPP torna duas súmulas superadas:
Súmula 244-STJ: Compete ao foro do local da recusa processar e julgar o crime de estelionato mediante cheque sem provisão de fundos. (SUPERADA)

Súmula 521-STF: O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato, sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos, é o do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado. (SUPERADA)

A situação é diferente quanto ao crime de estelionato praticado por meio saque de cheque fraudado.
O crime de estelionato praticado por meio saque de cheque fraudado compete ao Juízo do local da agência bancária da vítima. STJ. CC 182.977-PR, Rel. Min. Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 09/03/2022, DJe 14/03/2022 (info 728).

Quando se está diante de estelionato cometido por meio de cheques adulterados ou falsificados, a obtenção da vantagem ilícita ocorre no momento em que o cheque é sacado, pois é nesse momento que o dinheiro sai efetivamente da disponibilidade da entidade financeira sacada para, em seguida, entrar na esfera de disposição do estelionatário.

Em tais casos, entende-se que o local da obtenção da vantagem ilícita é aquele em que se situa a agência bancária onde foi sacado o cheque adulterado, seja dizer, onde a vítima possui conta bancária. (….)” (AgRg no CC 171.632/SC, Rel. Ministro Reynaldo Sores da Fonseca, Terceira Seção, DJe 16/06/2020).

A Súmula 48-STJ permanece vigente, posto que o art. 70, §4º não trata da hipótese de cheque falso.
Súmula 48-STJ: Compete ao juízo do local da obtenção da vantagem ilícita processar e julgar crime de estelionato cometido mediante FALSIFICAÇÃO de cheque.

Caso concreto adaptado.
Caio era funcionário da empresa Turismo LTDA. Em associação com dois agentes, Caio simulava contratos de parceria com empresas terceiras, com a intenção de obter para si vantagens ilícitas, a saber: passagens aéreas e reserva de veículos e hotéis. O estelionatário fazia uso próprio de tais passagens, bem como as repassava para terceiros, obtendo o proveito do crime.

A empresa vítima possui sede em Brasília/DF, contudo Caio, apontado como estelionatário, trabalhava como representante comercial na filial localizada no município de São Paulo, onde os golpes teriam sido praticados em conluio com outros dois agentes, também residentes em municípios localizados no Estado de São Paulo.

Qual a competência para julgar o crime?
O núcleo da controvérsia consiste em definir se o julgamento do delito de estelionato compete ao Juízo de Direito da 4ª Vara Criminal de Brasília/DF, considerando-se o local da sede da empresa vítima e de sua agência bancária; ou ao Juízo de Direito da Vara Criminal do Foro Central Barra Funda/SP, em razão do local onde o agente delituoso auferiu o proveito do crime.

O dissenso jurisprudencial retratado nos precedentes colacionados pelos Juízos envolvidos neste conflito deixou de existir com o advento da Lei n. 14.155/2021, que acrescentou o § 4º do art. 70 do Código de Processo Penal – CPP com o seguinte teor:

Código de Processo Penal.
Art. 70, §4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção.

Todavia, a inovação legislativa disciplinou a competência do delito de estelionato em situações específicas descritas pelo legislador, as quais não ocorrem no caso concreto, porquanto os autos não noticiam a ocorrência transferências bancárias ou depósitos efetuados pela empresa vítima e tampouco de cheque emitido sem suficiente provisão de fundos.

No crime de estelionato, não identificadas as hipóteses descritas no § 4º do art. 70 do CPP, a competência deve ser fixada no local onde o agente delituoso obteve, mediante fraude, em benefício próprio e de terceiros, os serviços custeados pela vítima.
No contexto dos autos, não identificadas as hipóteses descritas no § 4º do art. 70 do CPP deve incidir o teor do caput do mesmo dispositivo legal, segundo o qual “a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução”. Portanto, é competente o Juízo da Vara Criminal do Foro Central Barra Funda/SP.

Sobre o tema a Terceira Seção desta Corte Superior, recentemente, pronunciou-se no sentido de que nas situações não contempladas pela novatio legis, aplica-se o entendimento pela competência do Juízo do local do eventual prejuízo. STJ. CC 185.983-DF, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 11/05/2022, DJe 13/05/2022 (info 736).

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