Exemplo Didático
Ana contratou um seguro de vida para seu esposo, Carlos, onde ela própria e seus dois filhos são nomeados como beneficiários. Após, Ana põe em prática, com êxito, o seu plano para matar Carlos.
Ana poderá receber a indenização do seguro?
Não. É nulo o contrato para garantia de risco proveniente de ato doloso do segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro.
E os filhos de Ana e Carlos, que também são beneficiários do seguro de vida, mas não estavam envolvidos no homicídio, podem receber a indenização securitária?
Também não. O ato do indivíduo de contratar um seguro sobre a vida de outrem com a intenção de ceifar a vida do segurado impede o recebimento da indenização securitária por quaisquer dos beneficiários e gera nulidade do contrato.
Controvérsia.
O propósito recursal consiste em definir se, no contrato de seguro sobre a vida de outrem, a morte do segurado causada por ato ilícito do contratante obsta o recebimento da indenização securitária pelos demais beneficiários do seguro. Na espécie, a contratante do seguro ajustou seguro sobre a vida de seu esposo e colocou fim à vida do segurado com a intenção de receber a indenização securitária.
Seguro de vida de outrem.
No seguro sobre a vida de outrem, contratante e segurado (titular do interesse garantido) são pessoas distintas. O segurado é o portador do risco de morte, mas não participa da contratação e o contratante é quem celebra o contrato, assume todas as obrigações e adquire a qualidade de beneficiário do seguro, por ser titular do interesse garantido.
Nulidade do contrato.
O indivíduo que contrata um seguro sobre a vida de outrem com a intenção de ceifar a vida do segurado e, por conseguinte, obter a indenização securitária, além de buscar a garantia de interesse ilegítimo, age, de forma deliberada, com a intenção de prejudicar outrem. A ausência de interesse na preservação da vida do segurado acarreta a nulidade do contrato de seguro por violação ao disposto nos arts. 757, 762 e 790 do CC/02.
Ante a gravidade do vício de nulidade que contamina o contrato de seguro celebrado com a intenção de garantir ato doloso e sem interesse legítimo do contratante, ele não pode produzir qualquer efeito jurídico. Logo, ainda que haja outros beneficiários do seguro além do autor do ato ilícito, eles não receberão a indenização securitária.
STJ. REsp 2.106.786-PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 2/4/2024 (info 806).