Súmula 623-STJ e Tema repetitivo 1.204/STJ.
Inicialmente, ressalte-se que nos termos da Súmula n. 623 do STJ:
Súmula 623-STJ: As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor
Já a tese fixada no Tema repetitivo nº 1.204/STJ que:
#Tese Repetitiva – Tema 1.204-STJ: As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo possível exigi-las, à escolha do credor, do proprietário ou possuidor atual, de qualquer dos anteriores, ou de ambos, ficando isento de responsabilidade o alienante cujo direito real tenha cessado antes da causação do dano, desde que para ele não tenha concorrido, direta ou indiretamente.
Caso concreto adaptado.
João possui um terreno com um imóvel , no qual foi causada uma degradação ambiental. A Prefeitura, por sua vez, decide desapropriar por utilidade pública do imóvel. A prefeitura, então, paga a João a indenização devida e realiza da desapropriação. Algum tempo depois, o Ministério Público propõe uma ação civil pública exigindo a reparação do dano ambiental, considerando que João é corresponsável pelo dano causado.
João poderá ser condenado a indenizar os danos ambientais causados?
Não. O expropriado não tem o dever de pagar pela reparação do dano ambiental no bem desapropriado, podendo responder, no entanto, por eventual dano moral coletivo.
O caso concreto é distinto dos que ensejaram a Súmula 623-STJ e o Tema repetitivo 1.204/STJ.
Todavia, o caso em análise se distingue da supracitada orientação quanto à possibilidade de cobrar a reparação do dano tanto do proprietário atual quanto do anterior, visto que no representativo da controvérsia se trata de aquisição derivada da propriedade (transferência voluntária), ao passo que aqui se está diante de aquisição originária por desapropriação, que tem contornos próprios e distintos.
No caso da desapropriação, o ônus de reparação que recaía sobre o bem (de natureza histórico-cultural) expropriado já foi considerado no preço (justa indenização).
Nesse contexto, o art. 31 do Decreto-Lei n. 3.365/1941 disciplina que “ficam sub-rogados no preço quaisquer ônus ou direitos que recaiam sobre o bem expropriado”.
Isso implica dizer que o ônus de reparação que recaía sobre o bem (de natureza histórico-cultural) expropriado já foi considerado no preço (justa indenização) que foi desembolsado pelo Município para a aquisição do imóvel, isto é, a Fazenda municipal já descontou o passivo ambiental do valor pago.
Diante desse quadro superveniente, a condenação da parte expropriada no dever de pagar pela reparação do imóvel desapropriado implicaria violação do postulado do non bis in idem, uma vez que o particular amargaria duplo prejuízo pelo mesmo fato: perceberia indenização já descontada em razão do passivo ambiental e ainda teria que pagá-lo (o passivo) novamente na ação civil pública.
Desse modo, embora a obrigação de reparação ambiental permaneça de natureza propter rem, competirá ao ente expropriante atendê-la (a obrigação), pois o valor relativo ao passivo ambiental já deve ter sido excluído da indenização.
Eventualmente, entretanto, é possível a condenação por danos morais coletivos em virtude do dano causado.
Por outro lado, é possível reconhecer a legitimidade passiva do particular em relação ao dever, em tese, de reparar o suposto dano moral coletivo, pois, nesse caso, a obrigação ou o ônus não estão relacionados ao próprio bem, inexistindo sub-rogação no preço. O dano moral, nessa modalidade, é experimentado pela coletividade em caráter difuso, de modo que o dever de indenizar é completamente independente do destino do imóvel expropriado.
STJ. AREsp 1.886.951-RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por maioria, julgado em 11/6/2024, DJe 20/6/2024 (info 818).