Tribunais de Contas.
Os Tribunais de Contas são órgãos previstos na Constituição Federal de 1988 (CF/88) com a competência para fiscalizar a administração pública quanto à legalidade, legitimidade e economicidade de seus atos, especialmente no que tange à gestão de recursos públicos.

O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União. Ademais, Os Tribunais de contas podem aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário e as decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo.

Exemplo Didático.
José, gestor do município de “Cidade Verde”, realizou uma série de despesas sem observar as normas de Direito Financeiro. O Tribunal de Contas do Estado (TCE) detectou as irregularidades e aplicou as seguintes sanções:
Ressarcimento ao erários: No valor de R$1.000.000,00.
Multa 1: Uma multa de R$ 200.000,00 para ressarcimento ao erário, devido ao prejuízo causado ao patrimônio público do município.
Multa 2: Uma multa de R$ 100.000,00 pela inobservância das normas de Direito Financeiro.

Qual a natureza das multas aplicadas?
É possível agrupar as sanções patrimoniais de acordo com as seguintes modalidades de responsabilidade financeira:

Imposição do dever de recomposição do erário: também intitulado, por alguns, de imputação de débito;
Multa proporcional ao dano causado ao erário: que decorre diretamente – e em razão – do prejuízo infligido ao patrimônio público; e
Multa simples (meramente sancionatória): aplicada em razão da inobservância de normas financeiras, contábeis e orçamentárias, ou como consequência direta da violação de deveres de colaboração (obrigações acessórias) que os agentes fiscalizados devem guardar em relação ao órgão de controle.

No caso, tem-se que a Multa 1 é uma multa proporcional ao dano causado ao erário. Já a multa 2 é uma multa simples, aplicada em razão da inobservância de normas financeiras.

A quem cabe a execução de cada multa?
Em primeiro lugar, destaque-se que o Tribunal de Contas não tem legitimidade para executar suas decisões. A legitimidade é do ente público prejudicado. Vejamos:

O art. 71, §3º, da CF/88 não outorgou ao Tribunal de Contas legitimidade para executar suas decisões das quais resulte imputação de débito ou multa. A competência para tal é do titular do crédito constituído a partir da decisão, ou seja, o ente público prejudicado.
STF. 2ª Turma. AI 826676 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 08/02/2011.

E de quem será a legitimidade no caso concreto?

Ressarcimento de danos ao erário e Multa 1: A execução desta multa cabe ao Município de “Cidade Verde”, pois é destinada ao ressarcimento do dano causado ao patrimônio público municipal.
Multa 2: A execução desta multa cabe ao Estado, pois trata-se de uma sanção por descumprimento de normas de Direito Financeiro, sem relação direta com o ressarcimento ao erário.

Os estados possuem legitimidade ativa para executar multas meramente sancionatórias aplicadas por seus Tribunais de Contas.
Os estados possuem legitimidade ativa para executar multas meramente sancionatórias aplicadas por seus Tribunais de Contas em face de agentes públicos municipais que, por seus atos, infrinjam as normas de Direito Financeiro ou violem os deveres de colaboração com o órgão de controle, impostos pela legislação.

A Constituição Federal de 1988 confere aos Tribunais de Contas em todo o País a competência para aplicar as sanções previstas em lei aos responsáveis por ilegalidades de despesas ou irregularidades nas contas.

Consoante o julgamento que originou a fixação da tese do Tema 642 da repercussão geral, o que determina o ente competente para executar a multa aplicada pelas Cortes de Contas estaduais é a natureza jurídica dessa sanção.

#Tese de Repercussão Geral – Tema 642: O Município prejudicado é o legitimado para executar crédito decorrente de multa aplicada por Tribunal de Contas estadual a agente público municipal, em razão de danos causados ao erário municipal.

Se a multa aplicada pelo Tribunal de Contas decorre da prática de atos que causaram prejuízo ao erário municipal, o legitimado ativo para a execução do crédito fiscal é o município lesado, e não o estado.
Entendimento diverso caracterizaria hipótese de enriquecimento sem causa. STF. RE 1003433/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado 14.9.2021 (info 1029).

O STJ adequou seu entendimento ao STF.
O Município prejudicado é o legitimado para a execução de crédito decorrente de multa aplicada por Tribunal de Contas estadual a agente público municipal, em razão de danos causados ao erário municipal. STJ. AgInt no AREsp 926.189-MG, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 15/02/2022 (info 725).

Por que o STJ entendia de forma diferente?
O STJ entendia que, tendo em vista a multa aplicada possuir caráter punitivo, seus valores deveriam ser revertidos em favor do ente mantenedor do Tribunal de Contas. Portanto, se o TCE aplicou a multa, tais valores deveriam ser revertidos em favor do Estado. Tal posição, entretanto, está superada.

A multa simples imposta ao agente público municipal — que diz respeito à modalidade sancionatória de responsabilidade financeira — em razão da grave inobservância de normas financeiras, contábeis e orçamentárias, ou como consequência direta da violação de deveres de colaboração que os agentes fiscalizados devem guardar com o órgão de controle (obrigações acessórias), configura ferramenta de desincentivo à prática de futuras transgressões dessas normas e, em certos casos, de reafirmação da autoridade das decisões ou diligências determinadas pelos Tribunais de Contas.

Por outro lado, as penalidades de imputação de débito e de multa proporcional ao dano abrangem a modalidade reintegratória de responsabilidade financeira, eis que visam recompor o erário em virtude de desvio, pagamento indevido ou falta de cobrança ou liquidação, nos termos da lei.

Conclusão…
Nesse contexto, quando as sanções aplicadas pelo Tribunal de Contas estadual a agente público municipal referirem-se ao ressarcimento ao erário, a legitimidade para executá-las é do município cujo patrimônio público foi atingido, ao passo que é o próprio estado o legitimado ativo para executar as multas que decorrem do poder sancionador da Corte de Contas (sanção pecuniária e que não possui qualquer relação com a existência de dano ao erário).

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação, bem como:
(i) assentou que a presente decisão não afeta automaticamente a coisa julgada formada em momento anterior à publicação da ata deste julgamento; e
(ii) determinou o acréscimo de uma nova proposição (item 2) à tese do Tema 642 da repercussão geral, a fim de abranger o novo entendimento do Tribunal.

Como ficou a tese?
#Tese de Repercussão Geral – Tema 642-STF:
1. O Município prejudicado é o legitimado para a execução de crédito decorrente de multa aplicada por Tribunal de Contas estadual a agente público municipal, em razão de danos causados ao erário municipal.
2. Compete ao Estado-membro a execução de crédito decorrente de multas simples, aplicadas por Tribunais de Contas estaduais a agentes públicos municipais, em razão da inobservância das normas de Direito Financeiro ou, ainda, do descumprimento dos deveres de colaboração impostos, pela legislação, aos agentes públicos fiscalizados.
STF. ADPF 1.011/PE, relator Ministro Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em 28.06.2024 (info 1143).

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