O paciente com Síndrome de Down possui direito, de forma ilimitada e multidisciplinar, as terapias prescritas pelo médico?
Sim. O plano de saúde é obrigado a cobrir, de forma ilimitada, as terapias prescritas ao paciente com Síndrome de Down.

Decisão recorrida.
O Tribunal a quo concluiu que a operadora de saúde tem o dever de fornecer os tratamentos prescritos, mostrando-se abusiva a limitação, uma vez que “a restrição do número de sessões da terapia é incompatível com a própria função social dos contratos e os princípios constitucionais, especialmente quando se trata de plano de saúde, verificando-se que, no caso dos autos, em se tratando de criança de apenas 8 (oito) anos de idade, com deficiência física, condição que afeta diretamente sua convivência social, dada as peculiaridades das limitações, as quais acabam por caracterizar o paciente como consumidor em situação de clara desvantagem frente ao prestador do serviço”.

A decisão está coerente com a jurisprudência do STJ.
No mesmo sentido, esta Corte Superior entende que, nos casos de paciente com Síndrome de Down, está o plano de saúde obrigado a cobrir, de forma ilimitada, as terapias prescritas: “Segundo a diretriz da ANS, o fato de a síndrome de Down não estar enquadrada na CID F84 (transtornos globais do desenvolvimento) não afasta a obrigação de a operadora cobrir o tratamento multidisciplinar e ilimitado prescrito ao beneficiário com essa condição que apresente quaisquer dos transtornos globais do desenvolvimento”. (AgInt no AREsp n. 2.543.020/SP, rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 24/6/2024, DJe de 26/6/2024).
STJ. Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/8/2024, DJe 28/8/2024 (info 826).

APROFUNDANDO!
Qual a natureza do rol de procedimentos e eventos da ANS?
Até 2022, a jurisprudência do STJ era no sentido da natureza exemplificativa do rol. STJ. AgInt no REsp 1.874.078-PE, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/10/2020, DJe 29/10/2020 (info 682).

Em 2022, a Segunda Seção do STJ passou a entender que o rol tem natureza taxativa (ou taxativa mitigada).
1. O rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar é, em regra, taxativo;
2. A operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao rol;
3. É possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extra rol;
4. Não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que
(i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao rol da Saúde Suplementar;
(ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências;
(iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como CONITEC e NATJUS) e estrangeiros; e
(iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS.
STJ. EREsp 1.886.929-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 08/06/2022 (info 740).

Como resposta a decisão da Segunda Seção do STJ, foi editada a Lei nº 14.454, de 2022, que trouxe requisitos objetivos para a oferta de procedimentos não previstos no rol.
Tal procedimento está previsto no art. 10, §13, da Lei nº 9.656/1998. Há decisão do STJ mencionando que o rol agora é de natureza “exemplificativa mitigada”. STJ. QO no REsp 1.882.957-SP, Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, por maioria, julgado em 8/2/2023 (info 764).

Tratamento multidisciplinar para o Transtorno do Espectro Autista.
Especificamente quanto ao tratamento multidisciplinar para o TEA, a orientação consignada é no sentido de ser devida a cobertura do tratamento de psicoterapia, sem limite de sessões, admitindo-se que está previsto no rol da ANS, nos seguintes termos:
a) para o tratamento de autismo, não há mais limitação de sessões no Rol;
b) as psicoterapias pelo método ABA estão contempladas no Rol, na sessão de psicoterapia;
c) em relatório de recomendação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC), de novembro de 2021, elucida-se que é adequada a utilização do método da Análise do Comportamento Aplicada (ABA).
STJ. Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/12/2022, DJe 16/12/2022 (info 764).

Jurisprudência em Teses do STJ, Ed. 213:
Tese 10: Até 1º/7/2022, data do início da vigência da Resolução Normativa n. 539/2022 da ANS, o reembolso integral de tratamento multidisciplinar para beneficiário portador de Transtorno do Espectro Autista – TEA realizado fora da rede credenciada somente será devido se decorrer de descumprimento de ordem judicial que determina a cobertura ou de inobservância de prestação contratualmente assumida.

Tese 11: É abusiva a recusa de cobertura pela operadora do plano de saúde de terapia multidisciplinar, bem como a limitação do número de sessões, aos beneficiários com diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista – TEA.

Tese 12: O fato de a Paralisia Cerebral e a Síndrome de Down não estarem enquadradas na CID-10 F84 (transtornos globais do desenvolvimento) não afasta a obrigação de as operadoras de planos de saúde fornecerem cobertura de terapia multidisciplinar, sem limite de sessões, prescrita a beneficiário.

A equoterapia e a musicoterapia são de cobertura obrigatória pelas operadoras de planos de saúde para os beneficiários com transtornos globais do desenvolvimento, dentre eles o transtorno do espectro autista.
STJ. Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 20/2/2024 (info 802).

Até 1/7/2022, data da vigência da Resolução Normativa n. 539/2022 da ANS, é devido o reembolso integral de tratamento multidisciplinar para beneficiário portador de transtorno do espectro autista realizado fora da rede credenciada, inclusive às sessões de musicoterapia, na hipótese de inobservância de prestação assumida no contrato ou se ficar demonstrado o descumprimento de ordem judicial.
STJ. REsp 2.043.003-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 21/3/2023, DJe 23/3/2023 (info 769).

Em sentido semelhante: As terapias multidisciplinares prescritas por médico assistente para o tratamento de beneficiário de plano de saúde, executadas em estabelecimento de saúde, por profissional devidamente habilitado, devem ser cobertas pela operadora, sem limites de sessões.
STJ. REsp 2.061.135-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/6/2024, DJe 14/6/2024 (info 819).

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Área de Membros

Escolha a turma que deseja acessar: