Conceitos Necessários.
Gorjetas: As gorjetas são valores pagos espontaneamente pelos clientes aos empregados, em adição ao preço do serviço ou produto. As gorjetas podem ser distribuídas aos empregados de forma direta ou indireta (por exemplo, em uma caixinha coletiva).
Natureza Salarial das Gorjetas: Conforme a legislação trabalhista, as gorjetas têm natureza salarial, ou seja, são consideradas parte da remuneração do empregado. Isso está previsto no artigo 457, § 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Simples Nacional: É um regime tributário diferenciado, simplificado e favorecido para microempresas e empresas de pequeno porte, conforme definido na Lei Complementar nº 123/2006. O Simples Nacional unifica o pagamento de vários tributos em uma única guia de recolhimento, utilizando como base de cálculo a receita bruta da empresa.
Receita Bruta: De acordo com o artigo 3º, § 1º, da Lei Complementar nº 123/2006, considera-se receita bruta o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos.

Exemplo Didático.
Imagine um restaurante de pequeno porte que opta pelo regime do Simples Nacional. O restaurante, além de vender refeições, também cobra uma taxa de serviço (gorjeta) de 10% sobre o valor total da conta, que é repassada integralmente aos garçons.

O valor arrecadado a título de gorjeta deve ser incluído na receita bruta ou lucro do restaurante para fins de apuração do Simples Nacional?
Não. O valor pago a título de gorjetas, ante a sua natureza salarial, não pode integrar o conceito de faturamento, receita bruta ou lucro para fins de apuração tributária. Conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), as gorjetas possuem natureza salarial e não podem ser consideradas como receita bruta, faturamento ou lucro para fins de apuração tributária. Portanto, a gorjeta, por ter natureza salarial, não integra o conceito de receita bruta definido na Lei Complementar nº 123/2006.

Peculiaridades do caso concreto.
Na origem, o feito decorre de mandado segurança em que se busca o reconhecimento do direito líquido e certo da contribuinte impetrante de que as gorjetas e o couvert artístico não sejam considerados receita bruta para fins de tributação sob o regime do Simples Nacional, ou seja, discute-se a possibilidade de inclusão da gorjeta no conceito de receita bruta, base de cálculo do Simples Nacional.

Regramento legal.
De acordo com o art. 18, § 3º, da Lei Complementar n. 123/2006, a tributação unificada “Simples Nacional” tem como base de cálculo a receita bruta da microempresa ou empresa de pequeno porte optante:
Lei Complementar nº 123/2006.
Art. 18. O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das alíquotas efetivas, calculadas a partir das alíquotas nominais constantes das tabelas dos Anexos I a V desta Lei Complementar, sobre a base de cálculo de que trata o § 3º deste artigo, observado o disposto no § 15 do art. 3º.
(…)
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1º, 1º-A e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário.

Já o art. 3º, § 1º, dessa norma traz o conceito de receita bruta e dispõe que se considera:

Lei Complementar nº 123/2006.
Art. 3º, § 1º Receita bruta, para fins do disposto no caput deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos.

Essa já era a posição do STJ.
Nesse diapasão, esta Corte Superior adotou o entendimento de que o valor pago a título de gorjetas, ante a sua natureza salarial, não pode integrar o conceito de faturamento, receita bruta ou lucro para fins de apuração tributária. Nesse sentido: AgInt no REsp n. 1.668.117/PR, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 21/2/2022, DJe de 24/2/2022 e AREsp n. 1.604.057/PE, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 4/2/2020, DJe de 12/5/2020. O tema também já foi veiculado em informativos do STJ:

As gorjetas não se incluem na base de cálculo do regime fiscal denominado “Simples Nacional”.
STJ. AREsp 2.381.899-SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 17/10/2023, DJe 19/10/2023 (info 794).

Dessa forma, considerando o conceito de receita bruta explicitado na Lei Complementar n. 123/2006, não se vislumbra nenhuma possibilidade de considerar a gorjeta como produto de venda, preço de serviço prestado ou resultado nas operações em conta alheia, pois, de acordo com o entendimento do STJ, a gorjeta tem natureza salarial, ou seja, compõe o salário do empregado. Assim, a referida verba não deve integrar a receita bruta para fins de cálculo do Simples Nacional.
STJ. AgInt no AREsp 1.846.725-PI, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 8/4/2024, DJe 18/4/2024 (info 811).

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