Exemplo Didático
Uma instituição financeira chamada “Banco Finanças S.A.” está enfrentando dificuldades financeiras e, por decisão do Banco Central do Brasil, teve a sua liquidação extrajudicial decretada. Um liquidante, nomeado pelo Banco Central, assumiu a administração do banco e, após análise dos ativos e passivos, decidiu entrar com um pedido de falência no Poder Judiciário. Portanto, temos os seguintes personagens:
Banco Finanças S.A.: A instituição financeira em questão.
Liquidante: Nomeado pelo Banco Central para administrar a liquidação.
Acionistas e ex-administradores: Interessados em acompanhar o processo e impugnar a decretação da falência.

O liquidante, autorizado pelo Banco Central, entra com um pedido de falência do Banco Finanças S.A. perante o juiz. Os acionistas e ex-administradores desejam intervir no processo para impugnar a decretação da falência, pois acreditam que a insolvência não é evidente.

Os acionistas e ex-administradores do Banco Finanças S.A. têm legitimidade para intervir no processo de falência instaurado a pedido do liquidante?
Sim. De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no REsp 1.852.165-MG, os acionistas, ex-administradores e controladores da instituição financeira têm legitimidade para intervir no processo de falência instaurado a pedido do liquidante. Não há necessidade de prévia autorização da Assembleia Geral em se tratando de falência decorrente de procedimento de liquidação extrajudicial.

Liquidação Extrajudicial
A liquidação extrajudicial é um procedimento administrativo para resolver a situação de insolvência de instituições financeiras, previsto na Lei n. 6.024/1976. A liquidação é decretada pelo Banco Central do Brasil, e um liquidante é nomeado para administrar os ativos da instituição.

Diretos do falido.
Os direitos do falido foram expressamente previstos no art. 103 da Lei n. 11.101/2005 porque, com a decretação da quebra, ele perde o direito de administrar seus bens ou deles dispor, passando a geri-los o administrador judicial nomeado pelo juiz ou, na hipótese de falência de instituição financeira, o liquidante previamente nomeado pelo Banco Central do Brasil.

Isso não significa, contudo, que o empresário ou sociedade falida sejam extintos ou percam a capacidade processual, tanto que os dispositivos legais em referência permitem fiscalizar a administração da falência, adotar providências necessárias para a conservação de seus direitos ou dos bens arrecadados ou ainda intervir nos processos em que a massa falida seja parte ou interessada.

Os acionistas ex-administradores e controladores revelam interesse jurídico em intervir no feito e impugnar a decretação da falência.
Não se pode recusar, outrossim, a legitimidade da falida ainda na fase cognitiva ou pré-falimentar. Com efeito, se a lei confere determinados direitos à massa falida no que tange à fiscalização da administração da massa e ao zelo pela conservação de seus direitos e bens arrecadados, com muito mais razão pode opor-se à própria decretação da falência, momento em que o poder judiciário se volta a verificar o estado patrimonial do devedor e a constatação da insolvência. Diversos efeitos jurídicos da quebra em relação aos acionistas ex-administradores e controladores revelam interesse jurídico em intervir no feito e impugnar a decretação da falência.

A falência é um processo estrutural, multifacetado e policêntrico, com interesses plurais e setoriais.
A falência constitui processo em que se relacionam múltiplos interesses que circundam a companhia e mesmo o interesse público de tutela do crédito e do saneamento do mercado em contraposição ao interesse da própria falida, muitas vezes colidente com o destino liquidatório, permitindo-se qualificá-la como processo estrutural, multifacetado e policêntrico, com interesses plurais e setoriais que demandam um desencadeamento decisório especial que contemple os diversos atores e perfis envolvidos. Nesse contexto, é imperioso reconhecer a legitimidade dos sócios e, sobretudo, dos administradores, para acompanhar o procedimento e conduzir seus interesses para que sejam sopesados na arena decisional.

Regime de liquidação extrajudicial.
O regime de liquidação extrajudicial constitui uma das modalidades do sistema de resolução das instituições financeiras, procedimento administrativo que se assemelha à falência – especialmente em razão de sua finalidade – e visa, por conseguinte, à remoção da instituição financeira e à paralisação de suas atividades. A decretação da liquidação extrajudicial implica, automaticamente, o afastamento dos administradores da instituição financeira (art. 50 da Lei n. 6.024/1976).

Lei nº 6.024/1976 – Intervenção e liquidação extrajudicial de instituições financeiras.
Art. 50. A intervenção determina a suspensão, e, a liquidação extrajudicial, a perda do mandato respectivamente, dos administradores e membros do Conselho Fiscal e de quaisquer outros órgãos criados pelo estatuto, competindo, exclusivamente, ao interventor e ao liquidante a convocação da assembleia geral nos casos em que julgarem conveniente.

O pedido de falência da instituição financeira submetida a regime de liquidação extrajudicial compete exclusivamente ao liquidante, mediante autorização do Banco Central do Brasil.
Consequentemente, o pedido de falência da instituição financeira submetida a regime de liquidação extrajudicial compete exclusivamente ao liquidante, mediante autorização do Banco Central do Brasil, excluindo-se, a partir da decretação da liquidação, a legitimidade da própria instituição financeira, seus acionistas ou credores.

Não há exigência de prévia autorização assemblear.
Em se tratando de falência decorrente de anterior procedimento de liquidação extrajudicial, não há exigência da prévia autorização da assembleia geral, como prevê o art. 122, IX, da Lei n. 6.404/1976.

Lei nº 6.404/1976 – Lei das Sociedades Anônimas.
Art. 122. Compete privativamente à assembleia geral:
IX. autorizar os administradores a confessar falência e a pedir recuperação judicial;

A Lei n. 6.024/1976 é norma especial em relação à Lei n. 11.101/2005 – que prevê procedimentos recuperatório e liquidatório da generalidade das sociedades empresárias e empresários -, afastando-se, pelo princípio da especialidade e pelas peculiaridades dos procedimentos resolutórios das instituições financeiras, a disposição da legislação das companhias.
STJ. REsp 1.852.165-MG, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/4/2024, DJe 30/4/2024 (info 810).

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