Adiantamento a Contrato de Câmbio (ACC)
O Adiantamento a Contrato de Câmbio (ACC) é um contrato por meio do qual a empresa recebe do banco, em moeda nacional, o adiantamento de um valor que ele só receberia no futuro, decorrente de uma exportação. Isso se dá, tendo em vista que por muitas vezes as operações de exportação demoram a encerrar e o comprador só paga no momento do recebimento. Assim, o contrato tem duas finalidades:
1. Adiantar o recebimento de valores;
2. Garantir a taxa de câmbio do dia.
O banco, por sua vez, além do valor principal, recebe valores acessórios, tais como juros, multa e taxas, que são encargos derivados do contrato.
Por exemplo, imagine que uma empresa brasileira, a “Café do Brasil Ltda.”, fechou um contrato para exportar 100 toneladas de café para uma empresa nos Estados Unidos. O valor total do contrato é de 1 milhão de dólares, e o pagamento será feito após o recebimento do produto, o que está previsto para após 90 dias.
A Café do Brasil Ltda., por sua vez, celebra um contrato de adiantamento de câmbio com o Banco do Brasil S.A. Pelo contrato, o banco adiantará para a empresa o valor equivalente em reais pela taxa de câmbio do dia (1 dólar = 5 reais), mediante o desconto de determinadas taxas determinadas no momento da celebração do contrato (10% do valor total). Dessa forma, após o pagamento dos valores, o Banco do Brasil faria jus a receber:
Cinco milhões de reais, referentes ao valor principal.
Quinhentos mil reais, referentes a taxas e demais valores acessórios, tais como juros, multa e taxas, que são encargos derivados do contrato.
Por sua vez, o artigo 86, inciso II, da Lei nº 11.101/2005, estabelece que, em caso de falência, o valor adiantado ao devedor em operações de ACC deve ser restituído ao banco, sendo créditos de natureza extraconcursal.
Lei nº 11.101/05.
Art. 86. Proceder-se-á à restituição em dinheiro: (…)
II. da importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação, na forma do art. 75, §§ 3º e 4º, da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, desde que o prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da autoridade competente;
Apesar do valor principal do contrato de adiantamento de câmbio ser crédito extraconcursal (arts. 49, §4º e art. 86, II, da Lei nº 11.101/05), a lei nada fala sobre a exclusão dos valores acessórios da recuperação judicial.
Os encargos derivados de adiantamento de contratos de câmbio se submetem aos efeitos da recuperação judicial da devedora.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.810.447-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/11/2019 (Info 661).
Portanto, para que fique claro:
Valor principal referente ao adiantamento a contrato de câmbio (ACC): Não entra na recuperação judicial (crédito extraconcursal). Deve, portanto, ser requerido através de pedido de restituição (art. 86, II da Lei nº 11.101/05)
Encargos derivados do adiantamento a contrato de câmbio (ACC): Entram na recuperação judicial (créditos concursais).
Em igual sentido: O crédito referente ao efetivo adiantamento do contrato de câmbio deve ser objeto de pedido de restituição nos autos da recuperação judicial e os respectivos encargos reclamam habilitação no quadro geral de credores, por estarem sujeitos ao regime especial, mostrando-se inadequada a execução direta. STJ. REsp 1.723.978-PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/03/2022 (info 730).
Em igual sentido:
Cinge-se a controvérsia em definir se o credor de adiantamento de contrato de câmbio deve aguardar o pagamento dos demais créditos submetidos aos efeitos da recuperação judicial antes de receber os valores a ele devidos.
Nos termos do art. 49, § 4º, da Lei n. 11.101/2005, a importância entregue ao devedor decorrente de adiantamento de contrato de câmbio para exportação não se submete aos efeitos da recuperação judicial.
No adiantamento de contrato de câmbio, o produto da exportação passa a pertencer à instituição financeira, e não mais ao exportador financiado na operação. Portanto, os valores resultantes da exportação realizada por sociedade empresária integram o patrimônio da instituição financeira que realizou a antecipação do crédito, e não da sociedade em recuperação.
Na recuperação judicial, o pressuposto é que o devedor, a partir da concessão de prazos e condições especiais para pagamento, bem como de outros meios de soerguimento da atividade, consiga pagar todos os credores. Assim, não há falar em prioridade de pagamento de determinados credores em detrimento de outros, ressalvada a necessidade de observar o prazo para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho.
A jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que o adiantamento de crédito decorrente de contrato de câmbio deve ser objeto de pedido de restituição dirigido ao juízo da recuperação judicial.
STJ. REsp 2.070.288-PR, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/10/2024, DJe 18/10/2024 (info 832).