A CF/88 conferiu aos entes municipais o repasse de 25% do produto da arrecadação do ICMS.
A Constituição Federal de 1988 — com a finalidade de promover o federalismo fiscal cooperativo de equilíbrio e dar efetividade aos pilares do “Estado Fiscal” — instituiu um regime de partilha dos recursos tributários. Nesse contexto, ela conferiu aos entes municipais o repasse de 25% (vinte e cinco por cento) do produto da arrecadação do ICMS (CF/1988, art. 158, IV, “a”), cuja competência tributária é dos estados-membros e do Distrito Federal.
Exemplo didático.
Imagine a cidade de Soure, localizada no estado do Pará. O estado do Pará arrecada ICMS de várias empresas, incluindo uma grande fábrica de bicicletas chamada “Pedal Rápido S.A.”, localizada em Soure.
No ano de 2023, a empresa deveria ter recolhido R$1.000.000,00 de ICMS. Ocorre que, tal empresa tinha um crédito com o Estado no valor de R$ 200.000,00. Desta forma, a empresa compensou parcialmente o tributo devido, só recolhendo efetivamente R$800.000,00.
De acordo com a Constituição Federal de 1988, o Estado deve repassar 25% dessa arrecadação para os municípios do estado.
No exemplo, o Estado deve repassar aos municípios 25% de R$1.000.000,00 ou 25% de R$800.000,00?
25% de R$1.000.000,00. Os valores dos créditos tributários extintos que decorram de compensação ou de transação (CTN/1966, arts. 170 e 171) devem integrar o cálculo do percentual de transferência da quota pertencente às municipalidades sobre o produto da arrecadação do ICMS relativo à repartição constitucional das receitas tributárias, na medida em que é desnecessário, para esse cômputo, o efetivo recolhimento do imposto.
O repasse aos municípios não pode ser reduzido em virtude de benefícios fiscais.
Conforme jurisprudência desta Corte, na hipótese de parcela do produto de ICMS já arrecadado, é de pleno direito dos próprios municípios o repasse que lhes é devido na repartição constitucional de receitas, sendo incabível qualquer forma de condicionamento ou retenção pelos estados. Ademais — à luz do conceito técnico de arrecadação —, não se pode exigir o repasse, aos municípios, de parcela deduzida, renunciada ou extinta de ICMS resultantes de benefícios fiscais, pois esses recursos sequer ingressaram nos cofres estaduais.
Na espécie, a compensação de um crédito tributário pelo estado com uma dívida por ele adquirida configura evidente proveito econômico, mesmo sem recolhimento por parte do contribuinte, visto que representa um aumento na sua disponibilidade de recursos pela redução do seu passivo. Já no instituto da transação, a vantagem financeira obtida com o acordo equivale, na prática, à arrecadação do tributo. Portanto, seja por compensação, pagamento em espécie de tributos ou transação — modalidades de extinção do crédito tributário — os municípios têm direito à repartição de receitas tributárias, já que a receita pública é um fenômeno que antecede o recolhimento do imposto.
Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente a ação para assentar a constitucionalidade do art. 4º, § 1º, da Lei Complementar nº 63/1990.
STF. ADI 3.837/DF, relator Ministro Nunes Marques, julgamento virtual finalizado 20.09.2024 (info 1151).