Conceitos necessários ao entendimento do julgado:
Precatório: É uma ordem de pagamento expedida pelo Poder Judiciário para que um ente público (União, Estado, Município ou suas autarquias e fundações) pague uma dívida decorrente de condenação judicial transitada em julgado.
Juros de mora: São os juros devidos pelo atraso no cumprimento de uma obrigação.Incidem quando há atraso no pagamento.
Parcelamento de precatórios: Previsto no art. 78 do ADCT, permite que precatórios de alto valor sejam pagos em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de dez anos.
ADCT, Art. 78. Ressalvados os créditos definidos em lei como de pequeno valor, os de natureza alimentícia, os de que trata o art. 33 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e suas complementações e os que já tiverem os seus respectivos recursos liberados ou depositados em juízo, os precatórios pendentes na data de promulgação desta Emenda e os que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999 serão liquidados pelo seu valor real, em moeda corrente, acrescido de juros legais, em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de dez anos, permitida a cessão dos créditos.
“Período de graça constitucional”: Refere-se ao prazo estabelecido no art. 100, § 5º da Constituição Federal para o pagamento de precatórios. Vejamos o texto do dispositivo:
CF, Art. 100, §5º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente.
Exemplo didático:
Imagine que a Prefeitura de Curitiba foi condenada a pagar R$ 10 milhões a uma empresa de construção civil por uma obra realizada. O precatório foi expedido em 15 de junho de 2006. Devido ao alto valor, a Prefeitura optou pelo parcelamento em 10 prestações anuais de R$ 1 milhão cada, conforme o art. 78 do ADCT.
Considerando o “período de graça constitucional”, a Prefeitura teria até o final do exercício financeiro seguinte (31/12/2024) para pagar a primeira parcela. Se a Prefeitura não efetuar o pagamento da primeira parcela até essa data, começarão a incidir juros de mora a partir de 01/01/2025.
Se a Prefeitura continuar inadimplente nas parcelas seguintes, os juros de mora continuarão a incidir sobre as parcelas não pagas, mas não sobre aquelas que forem pagas em dia.
No caso do exemplo acima, se a Prefeitura de Curitiba não pagar a terceira parcela do precatório, que venceria em 31/12/2026, quando começariam a incidir os juros de mora sobre esta parcela específica?
De acordo com o julgado do STF, os juros de mora sobre a terceira parcela começariam a incidir a partir de 01/01/2027, ou seja, no primeiro dia do exercício financeiro seguinte ao que deveria ter sido paga a parcela. Isso ocorre porque o “período de graça constitucional” já teria se encerrado para esta parcela, permitindo a fluência imediata dos juros de mora em caso de inadimplemento.
Tema 132 da repercussão geral.
Conforme decidido no Tema 132 da repercussão geral, uma vez calculado o precatório pelo valor real do débito, acrescido de juros legais, estes não incidem nas parcelas (anuais, iguais e sucessivas) em que o precatório é fracionado, desde que adimplidas a tempo e corrigidas monetariamente. Nesse contexto, a fluência dos juros moratórios é permitida quando ausente o pagamento das parcelas do precatório.
Entretanto, não cabe a imposição de juros de mora durante o “período de graça constitucional” — aquele compreendido entre a expedição do precatório e o término do exercício financeiro seguinte —, de modo que a fluência desses juros durante o parcelamento deve ser iniciada somente após o referido lapso temporal.
Ressalvado o intervalo de que trata o § 5º do art. 100 da CF/1988, em que a fluência se reiniciará a partir do primeiro dia do exercício financeiro seguinte ao que deveria ter sido paga cada parcela.
Com base nesses e em outros entendimentos, a Primeira Turma, por maioria, deu parcial provimento ao agravo regimental, a fim de conceder parcialmente a segurança e permitir a incidência dos juros de mora durante o parcelamento, ressalvado o intervalo de que trata o § 5º do art. 100 da CF/1988, em que a fluência se reiniciará a partir do primeiro dia do exercício financeiro seguinte ao que deveria ter sido paga cada parcela.
STF. ARE 1.462.538 AgR/PR, relator Ministro Alexandre de Moraes, redator do acórdão Ministro Luiz Fux, julgamento finalizado em 06.08.2024 (info 1145).
Aprofundando!
É inconstitucional – por violar o princípio da separação dos Poderes (CF/1988, art. 2º), bem como por ofender os direitos fundamentais à propriedade (CF/1988, art. 5º, XXII e XXIV), à isonomia (CF/1988, art. 5º, caput), ao devido processo legal substantivo (CF/1988, art. 5º, LIV) e ao acesso à jurisdição (CF/1988, art. 5º, XXXV) – o regime excepcional de parcelamento de precatórios instituído pela EC nº 30/2000.
O Tribunal, também por maioria, modulou os efeitos da decisão para lhe conferir eficácia ex nunc, mantendo-se os parcelamentos realizados até 25.11.2010, data em que concedida a medida cautelar.
STF. ADI 2.356/DF, ADI 2.362/DF, relator Ministro Nunes Marques, redator do acórdão Ministro Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 06.05.2024 (info 1135).