Exemplo Didático.
Maria, de 25 anos, foi vítima de um crime sexual em 2010 enquanto estava sob o efeito de fortes sedativos após uma cirurgia. Naquele momento, ela não tinha capacidade de resistir ou de compreender totalmente a situação devido ao seu estado temporário de vulnerabilidade.
Durante a recuperação pós-operatória, enquanto ainda sob efeito dos sedativos, Maria foi abusada sexualmente por um funcionário do hospital.
Após alguns dias, Maria recuperou totalmente suas capacidades físicas e mentais, compreendendo o que havia acontecido e lembrando dos fatos.

Qual o crime cometido?
O crime de estupro de vulnerável (art. 217-A, §1º, do CP). Vejamos:
Código Penal.
Estupro de vulnerável (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009) (Cuidado. Menor de 14 anos = 13 anos)
Pena: reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

No caso concreto, a ação penal será pública incondicionada ou pública condicionada a representação da ofendida?
Perceba que o crime foi cometido em 2010 e, portanto, na vigência do texto do art. 225 do CP dado pela Lei nº 12.015/2009. Portanto, a ação penal era pública condicionada a representação. Vejamos:
No crime sexual cometido durante vulnerabilidade temporária da vítima, sob a égide do art. 225 do Código Penal com a redação dada pela Lei nº 12.015/2009, a ação penal pública é condicionada à representação.
STJ. 6ª Turma. REsp 1814770-SP, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 05/05/2020 (Info 675).
STJ. 5ª Turma. RHC 148.695/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonsenca, julgado em 17/08/2021.

Mas o art. 225, p. único não determinava que o crime cometido contra pessoa vulnerável era de ação penal pública incondicionada? Vejamos melhor o texto vigente à época do fato:
Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

No caso exemplificado o crime foi de estupro de vulnerável. Portanto, a ação penal não deveria ser pública incondicionada? Cuidado! A lei falava em “crime praticado contra vítima vulnerável”, o que não em crime de “estupro de vulnerável”.

Ademais, após forte embate jurisprudencial, o STJ firmou entendimento de que a vulnerabilidade a que se referia o art. 225, p. único, do CP, com redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009, era a vulnerabilidade permanente. Portanto, no caso de vulnerabilidade temporária, caberia a vítima, após recobrar a consciência, decidir se quer ou não representar.

Atualmente o debate tem relevância?
Desde o início da vigência da Lei nº 13.718/2018, todos os crimes contra a dignidade sexual são de ação penal pública incondicionada. Portanto, o debate só tem relevância para situações anteriores a sua vigência.
Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública incondicionada. (Redação dada pela Lei nº 13.718, de 2018)

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