Caso concreto.
A Federação das Associações dos Atletas Profissionais enviou uma carta a diversos patrocinadores do jogador Neymar informando-os de processo criminal contra o jogador na Justiça espanhola.

A ação penal foi causada pela transferência do atacante do Santos para o Barcelona, da Espanha, em 2013. O negócio milionário foi, segundo a federação, feito por meio de simulação contratual e fraude, com o intuito de reduzir o pagamento de impostos e encargos.

Aos patrocinadores de Neymar, a federação argumentou que o patrocínio somente pode ser ético e bem-sucedido quando celebrado com pessoas exemplares, e destacou que o jogador não se encaixa nessa descrição, por ter agido de forma eticamente errada e pouco exemplar.

A carta não se limitava a mera comunicação de fatos.
Ao enviar correspondência à patrocinadora do jogador de futebol, fez-se expressa menção a uma denúncia criminal oferecida perante a Justiça da Espanha, mas sem se limitar à mera reprodução dos fatos narrados na acusação criminal, tendo emitido juízo de valor sobre as circunstâncias e adjetivado a conduta do atleta como mentirosa, fraudulenta e desonesta.

A conduta não pode ser caracterizada como exercício de sua liberdade de expressão, porquanto este direito constitucional compreende a autonomia de receber e transmitir informações ou ideias sem uma validação ou censura prévias por terceiros, mas encontra limites nos demais direitos fundamentais individuais.

Terceiro ofensor também está sujeito à eficácia transubjetiva das obrigações, haja vista que seu comportamento não pode interferir indevidamente na relação, perturbando o normal desempenho da prestação pelas partes, sob pena de se responsabilizar pelos danos decorrentes de sua conduta.
O terceiro ofensor também está sujeito à eficácia transubjetiva das obrigações, pois, segunda a doutrina, “o comportamento do terceiro não pode manifestamente interferir, perturbando o normal desempenho da prestação pelas partes. Nesse último sentido, o terceiro não pode se associar a uma das partes para descumprir com a obrigação. Nesse caso, seria um terceiro-cúmplice no inadimplemento daquela prestação”.

Uma das hipóteses em que a conduta condenável do terceiro pode gerar sua responsabilização é a indução interferente ilícita, na qual o terceiro imiscui-se na relação contratual mediante informações ou conselhos com o intuito de estimular uma das partes a não cumprir seus deveres contratuais.

Liberdade de expressão X direitos de personalidade.
O Superior Tribunal de Justiça, à procura de solução que melhor concilie as situações de conflito entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade, estabeleceu, entre outros, os seguintes elementos de ponderação:
a) o compromisso ético com a informação verossímil;
b) a preservação dos chamados direitos da personalidade, entre os quais incluem-se os direitos à honra, à imagem, à privacidade e à intimidade; e
c) a vedação de veiculação de informações com intuito de difamar, injuriar ou caluniar a pessoa (animus injuriandi vel diffamandi).
STJ. REsp n. 801.109/DF, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 12/6/2012, DJe 12/3/2013.

Por conseguinte, não configura ato ilícito a notícia de fatos verossímeis mediante opiniões severas ou irônicas, sobretudo quando se tratar de figuras públicas, o que, todavia, não justifica o ataque pessoal à vítima.

Ainda que o contrato não tenha sido rompido, há dano moral indenizável.
Não se descura, também, de que o vínculo contratual entre atleta e patrocinadora não se rompeu após a emissão da carta, o que, contudo, não afasta a pretensão indenizatória do autor, pois, caso o contrato viesse a ser rescindido em decorrência da conduta da recorrente, a indenização abrangeria não apenas aquela decorrente dos danos morais, mas também a relativa aos danos patrimoniais por ele suportados.

Tanto é que o pleito autoral se limita à indenização por danos morais em razão da atuação difamatória de um terceiro com o objetivo de estimular uma das partes a não cumprir seus deveres contratuais, imiscuindo-se na relação contratual extrapolando os limites da licitude.

O colegiado ainda considerou razoável e apropriado o montante de R$ 50 mil a ser pago pela federação a Neymar, a título de danos morais pela conduta. STJ. Processo sob segredo de justiça, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/04/2022 (info 734).

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