O reconhecimento do direito às terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas não se sujeita ao marco temporal da promulgação da Constituição Federal (5/10/1988) nem à presença de conflito físico ou controvérsia judicial existentes nessa mesma data.
Em mudança de posicionamento jurisprudencial, esta Corte concluiu pela inaplicabilidade da teoria do fato indígena e pela prevalência da teoria do indigenato, segundo a qual a posse dos indígenas sobre as terras configura um direito próprio dos povos originários e cuja tradicionalidade da ocupação deve ser considerada conforme os parâmetros expressamente previstos no texto constitucional (CF/1988, art. 231, §§ 1º e 2º).

Renitente esbulho.
Se houver ocupação tradicional indígena ou renitente esbulho contemporâneo à data de promulgação da Constituição Federal de 1988, são assegurados aos não índios o direito à indenização pelas benfeitorias úteis e necessárias (CF/1988, art. 231, § 6º).

Mesmo ausente o renitente esbulho, consideram-se válidos e eficazes os atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada relativos a justo título ou posse de boa-fé das terras de ocupação tradicional indígena.
Porém, na hipótese de inexistir quaisquer dessas situações, consideram-se válidos e eficazes os atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada relativos a justo título ou posse de boa-fé das terras de ocupação tradicional indígena. Neste caso, o particular tem direito a ser previamente indenizado pela União ao valor correspondente às benfeitorias necessárias e úteis, ou, quando inviável o seu reassentamento, ao valor da terra nua.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 1.031 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário para anular o acórdão recorrido e reformar a sentença de primeiro grau, julgando, por conseguinte, improcedentes os pedidos deduzidos na petição inicial.
STF. RE 1.017.365/SC, relator Ministro Edson Fachin, julgamento finalizado em 27.9.2023 (info 1110).

ENTENDIMENTO SUPERADO!
Está superado o entendimento fixado no julgado: STF. 2ª Turma. RMS 29087/DF, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o acórdão, Min. Gilmar Mendes, julgado em 16/9/2014 (Info 759).

Síntese das conclusões previstas no Tema 1.031-STF.
A tese de Repercussão Geral Tema 1.031-STF aborda a demarcação e os direitos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Os principais pontos incluem:
• A demarcação é um procedimento declaratório do direito originário indígena sobre as terras ocupadas tradicionalmente.
• A posse indígena é diferente da posse civil, baseada na ocupação permanente, atividades produtivas, preservação ambiental e reprodução cultural segundo usos, costumes e tradições indígenas.
• A proteção desses direitos não depende de um marco temporal ou da presença de conflito físico ou judicial na data de promulgação da Constituição.
• Em caso de ocupação tradicional ou esbulho à época da promulgação da Constituição, aplica-se indenização por benfeitorias úteis e necessárias.
• Se não houver ocupação tradicional ou esbulho naquela época, são válidos atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada relativa a justo título ou posse de boa-fé, com direito a indenização pelas benfeitorias ou pelo valor da terra nua se o reassentamento for inviável.
• Não cabe indenização em casos já pacificados de terras indígenas reconhecidas e declaradas.
• É dever da União efetivar a demarcação, admitindo-se áreas reservadas apenas se impossível a demarcação, com a participação da comunidade indígena.
• A revisão de demarcação é permitida em caso de grave erro, mediante pedido dentro de cinco anos da demarcação anterior.
• O laudo antropológico é fundamental para demonstrar a tradicionalidade da ocupação.
• As terras indígenas são de posse permanente da comunidade, com usufruto exclusivo das riquezas naturais.
• São terras públicas, inalienáveis, indisponíveis e com direitos imprescritíveis.
• A ocupação tradicional é compatível com a tutela ambiental, assegurando o exercício das atividades tradicionais indígenas.
• Os povos indígenas têm capacidade civil e postulatória, podendo ser partes legítimas em processos que discutam seus interesses, com a legitimidade concorrente da FUNAI e a intervenção do Ministério Público.

Aprofundando o regime indenizatório.
Conforme a tese de Repercussão Geral Tema 1.031-STF, a questão da indenização pela terra é abordada nos seguintes termos:

• Ponto IV – Se houver ocupação tradicional indígena ou renitente esbulho (posse resistente) contemporâneo à promulgação da Constituição Federal: aplica-se o regime indenizatório relativo às benfeitorias úteis e necessárias, conforme previsto no § 6º do art. 231 da CF/88.
◦ CF, Art. 231, § 6º: O artigo estabelece que a nulidade e a extinção dos atos não geram direito a indenização ou a ações contra a União, com uma exceção quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé. Isto é, se houve benfeitorias realizadas de boa fé (sem conhecimento da irregularidade), pode haver, conforme a lei, uma possibilidade de indenização.
• Ponto V – Se não houver ocupação tradicional indígena na data da promulgação da Constituição ou renitente esbulho: os atos e negócios jurídicos perfeitos, bem como a coisa julgada relativos a justo título ou posse de boa-fé das terras de ocupação tradicional indígena, são válidos e eficazes.
◦ Nestes casos, assiste ao particular o direito à justa e prévia indenização das benfeitorias necessárias e úteis, pela União.
◦ Se o reassentamento dos particulares for inviável, eles terão direito à indenização pela União, correspondente ao valor da terra nua.
▪ Esta indenização pode ser paga em dinheiro ou em títulos da dívida agrária, conforme interesse do beneficiário.
▪ O pagamento será processado em autos apartados do procedimento de demarcação, com pagamento imediato da parte incontroversa, garantido o direito de retenção até o pagamento do valor incontroverso. É permitida a autocomposição e aplicado o regime do § 6º do art. 37 da CF.
• Ponto VI – Casos já Pacificados: Não cabe indenização em casos já pacificados, decorrentes de terras indígenas já reconhecidas e declaradas em procedimento demarcatório, exceto os casos judicializados e em andamento.

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