Contribuição para a Seguridade Social pelas empresas rurais.
As pessoas jurídicas produtoras rurais empregadoras, desde a Lei 8.212/1991 até a edição da Lei 8.870/1994, contribuíam para seguridade social, por meio de contribuição social incidente sobre a sua folha de salários, consoante o art. 22 daquele diploma legal.

Em 1994, essa contribuição foi substituída por outra que adotou, como base de cálculo da exação, a receita bruta proveniente da comercialização, prevista no artigo 25 da Lei 8.870/1994, ora impugnado. Eis o teor dos dispositivos:

Lei nº 8.870/1994:
Art 25. A contribuição devida à seguridade social pelo empregador, pessoa jurídica, que se dedique à produção rural, passa a ser a seguinte:
I. dois e meio por cento da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção;
II. um décimo por cento da receito bruta proveniente da comercialização de sua produção, para o financiamento da complementação das prestações por acidente de trabalho.
§ 1º O disposto no inciso I do art. 3º da Lei nº 8.315, de 23 de dezembro de 1991, não se aplica ao empregador de que trata este artigo, que contribuirá com o adicional de um décimo por cento da receita bruta proveniente da venda de mercadorias de produção própria, destinado ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR).

Por sua vez, o art. 195, I, da Constituição Federal à época da edição dessa Lei, previa:

Constituição Federal.
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I. dos empregadores, incidente sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro.

Faturamento x Receita Bruta.
Verifica-se que na redação do art. 195, I, da CF/88, não havia a possibilidade de incidência de contribuição social sobre “receita bruta”, apenas sobre “faturamento”.
Receita bruta: consiste no valor total gerado por uma empresa através da venda de seus produtos e/ou serviços.
Faturamento: representa não apenas o ato de faturar mas, sobretudo, o somatório do produto de vendas ou de atividades concluídas num dado período. Representa, assim, o vulto das receitas decorrentes da atividade econômica geral da empresa. (MELO, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário. 5 ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 193).

Ao final, prevaleceu que comercialização da produção é algo diverso de faturamento e que este não se confunde com receita, “tanto que a Emenda Constitucional nº 20/98 inseriu, ao lado do vocábulo ‘faturamento’, no inciso I do art. 195, o vocábulo ‘receita’, assentando, dessa forma, que a nova fonte deveria estar estabelecida em lei complementar.

Portanto, a redação originária do art. 25, I e II, da Lei 8.870/1994, foi considerada inconstitucional:
I. É inconstitucional a contribuição à seguridade social, a cargo do empregador rural pessoa jurídica, incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção, prevista no art. 25, I e II, da Lei 8.870/1994, na redação anterior à Emenda Constitucional 20/1998;

Lei nº 10.256/2001.
A Lei nº 10.256/2001 alterou o texto do art. 25 da Lei nº 8.870/1994, nos seguintes termos:

Art. 25. A contribuição devida à seguridade social pelo empregador, pessoa jurídica, que se dedique à produção rural, em substituição à prevista nos incisos I e II do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, passa a ser a seguinte: (Redação dada pela Lei nº 10.256, de 9.7.2001)
I. 1,7% (um inteiro e sete décimos por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; (Redação dada pela Lei nº 13.606, de 2018)
II. um décimo por cento da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, para o financiamento da complementação das prestações por acidente de trabalho.
§ 1º O disposto no inciso I do art. 3º da Lei nº 8.315, de 23 de dezembro de 1991, não se aplica ao empregador de que trata este artigo, que contribuirá com o adicional de zero vírgula vinte e cinco por cento da receita bruta proveniente da venda de mercadorias de produção própria, destinado ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR). (Redação dada pela Lei nº 10.256, de 9.7.2001)

Por sua vez, o art. 195, da CF, à época já tinha o seguinte texto:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (Vide Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
I. Do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
b) a receita ou o faturamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
c) o lucro;

É constitucional o art. 25, I e II, da Lei 8.870/1994, com a redação dada pela Lei 10.256/2001, que prevê contribuição à seguridade social, a ser paga pelo empregador rural pessoa jurídica, incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, em substituição à contribuição incidente sobre a folha de salários de que tratam os incisos I e II do art. 22 da Lei 8.212/1991.
Nos termos previstos na redação originária do dispositivo, feita pela Lei 8.870/1994, a referida contribuição é inconstitucional. Por outro lado, na redação conferida pela Lei 10.256/2001, que é posterior à EC 20/1998, ela é constitucional. Isso, porque somente após a alteração do texto constitucional ampliou-se a base econômica passível de incidência para também se considerar a receita.

A contribuição, por estar assentada no art. 195, I, b, da CF/1988, não necessita da edição de lei complementar, já que não representa nova fonte de custeio para a seguridade social.
Nesse sentido, esta Corte reconheceu que, quando há autorização constitucional para a instituição da contribuição, inexiste afronta aos arts. 154, I, e 195, § 4º, da CF/1988.

É possível criar uma contribuição social constante do texto constitucional com fato gerador ou base de cálculo idênticos aos de imposto existente.
Ademais, a proibição constitucional à cumulatividade e ao bis in idem impede a criação de imposto ou contribuição social novos com fato gerador ou base de cálculo próprios de imposto ou contribuição social já existentes. Porém, é possível criar uma contribuição social constante do texto constitucional com fato gerador ou base de cálculo idênticos aos de imposto existente. Quanto ao princípio da não cumulatividade dos novos tributos, ele não se refere à cumulação de dois tributos já previstos na Constituição Federal e incidentes sobre o mesmo fato gerador.

SENAR.
O SENAR é o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural, uma entidade brasileira responsável por oferecer programas de formação profissional e promoção social aos trabalhadores rurais e suas famílias. O art. 62, da ADCT determinou a sua criação e este foi efetivamente criado em 1991.

O objetivo do SENAR é capacitar e atualizar os trabalhadores rurais em suas atividades, além de promover o desenvolvimento pessoal e social deles e de suas famílias, visando a melhoria da qualidade de vida no campo e o aumento da produtividade do setor agropecuário.

Contribuição social destinada ao SENAR.
Nos termos do art. 2º, da Lei nº 8.540/1992, a contribuição da pessoa física de que trata a alínea a do inciso V do art. 12 da Lei 8.212, de 24 de julho de 1991, para o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), criado pela Lei 8.315, de 23 de dezembro de 1991, é de um décimo por cento incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção.

É constitucional a contribuição social destinada ao SENAR, a ser paga pelo empregador pessoa jurídica que se dedique à produção rural, estabelecida pelo § 1º do art. 25 da Lei 8.870/1994.
O ADCT expressamente autoriza a superposição tributária sobre fatos geradores idênticos (art. 240) e remete a legislação do SENAR aos mesmos moldes do regramento das demais entidades de serviço social e formação profissional (art. 62).

Além disso, a contribuição para o SENAR não se submete às vedações dos arts. 195, § 4º, e 154, I, da CF/1988, pois seu fundamento de validade reside no art. 149 da CF/1988.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 651 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário da União, para denegar a segurança pleiteada. Por unanimidade, o Tribunal fixou a tese supracitada.
STF. RE 700.922/RS, relator Ministro Marco Aurélio, redator do acórdão Ministro Alexandre de Moraes, julgamento finalizado em 15.3.2023 (info 1087).

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