Controvérsia.
Cinge-se a controvérsia sobre a possibilidade de creditamento, no âmbito do regime não-cumulativo das contribuições ao PIS e COFINS, dos valores que o contribuinte, na condição de substituído tributário, paga ao contribuinte substituto a título de reembolso pelo recolhimento do ICMS-substituição (ICMS-ST).
Substituição Tributária.
A substituição tributária é uma técnica de arrecadação de impostos que atribui a terceiros a responsabilidade pelo pagamento de um tributo devido por outrem. Para compreender o julgado, precisamos entender essencialmente três tipos de substituição tributária:
Substituição propriamente dita: A substituição tributária propriamente dita é a substituição do contribuinte por outro que faz parte da mesma cadeia de negócio jurídico.
Exemplo: uma indústria que faz o pagamento do tributo devido pelo fornecedor que realiza o serviço de logística.
Substituição Tributária “para frente” (ou Progressiva): Na substituição para frente, a cobrança dos tributos relacionados à circulação das mercadorias é feita de forma antecipada, a partir de uma base de cálculos realizada previamente.
Substituição Tributária “para trás” (ou Regressiva): Também chamada de “diferimento” ou “antecedente”, a tributação para trás ocorre quando a cobrança do ICMS é adiada. Ou seja, apenas o participante final da cadeia de circulação da mercadoria é que paga imposto, de forma integral e com todas as operações praticadas.
ICMS-substituição (ICMS-ST).
O ICMS-substituição (ICMS-ST) é um regime tributário especial destinado a facilitar a arrecadação e fiscalização do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é um imposto estadual no Brasil. Nesse regime, a responsabilidade pelo recolhimento do imposto é transferida de quem efetivamente realiza a venda final do produto para um contribuinte anterior na cadeia de distribuição, geralmente o fabricante ou o distribuidor.
A ideia é que, em vez de cada vendedor ao longo da cadeia de distribuição recolher o ICMS de forma individual, o imposto é calculado e pago antecipadamente por um “contribuinte substituto” sobre o preço final ao consumidor. Assim, quando os produtos passam de um estágio a outro da cadeia de comercialização, não há necessidade de nova cobrança de ICMS, até a venda final ao consumidor.
Esse método visa simplificar a administração do imposto, garantir maior eficácia na arrecadação, e reduzir casos de sonegação, pois o recolhimento do imposto é centralizado nas mãos de menos contribuintes, que geralmente têm maior capacidade administrativa e são mais fiscalizáveis pelo governo.
O substituto tributário é mero depositário de valor correspondente a tributo de outrem.
Quando o ICMS-ST é cobrado pelo vendedor dos bens ou prestador dos serviços na condição de substituto tributário este é mero depositário do valor financeiro correspondente ao tributo que será posteriormente entregue ao Fisco, em outras palavras, o substituto tributário é mero depositário de valor correspondente a tributo de outrem.
Essencialmente, o substituto tributário coleta o ICMS-ST com base no preço final de venda ao consumidor previsto e o mantém até o momento do repasse ao Estado. Esse valor, embora passe pelo substituto tributário, não é parte de suas finanças em termos de lucro ou receita; é meramente um valor que ele guarda e administra para fins de simplificação e eficiência na arrecadação tributária. Isso assegura que o Estado receba o imposto devido independentemente das transações subsequentes que ocorram até o consumidor final.
Portanto, o ICMS-ST não integra a receita bruta do substituto tributário.
Não sendo receita bruta do substituto tributário, o ICMS-ST não está na base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS não cumulativas por si (pelo substituto) devidas e definida nos arts. 1º e § 2º, das Leis ns. 10.637/2002 e 10.833/2003.
Como o princípio da não cumulatividade preconiza que o valor do tributo incidente sobre o bem na saída do vendedor é que irá gerar o valor do crédito na entrada do bem para o adquirente, se não houver tributação na saída do vendedor (substituto), não haverá creditamento na entrada para o adquirente (substituído) e qualquer crédito concedido nessa situação ou para além do valor do tributo pago na etapa anterior é crédito presumido ou fictício, carecedor de lei específica, na forma do art. 150, §6º, da CF/1988. Precedentes: Súmula Vinculante n. 58/STF; Repercussão Geral Tema n. 844/STF; recurso repetitivo REsp. n. 1.894.741/RS, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 27.04.2022. Assim, se as contribuições ao PIS/PASEP e COFINS não incidirem sobre o ICMS-ST na etapa anterior (substituto), na ausência de lei expressa criadora do crédito presumido, não podem gerar crédito para ser utilizado na etapa posterior (substituído).
Vamos entender isso através de um exemplo didático… Suponha a seguinte cadeia de distribuição:
Fabricante: Vende cada caixa de refrigerante ao distribuidor por R$136,00.
Distribuidor: Compra do fabricante e vende ao varejista por R$150,00.
Varejista: Compra do distribuidor e vende ao consumidor final por R$200,00.
ICMS-ST:
O ICMS-ST estimado sobre o preço final de venda ao consumidor (R$200,00) é de 18%, ou seja, R$36,00 por caixa.
Fabricante: Recolhe R$36,00 de ICMS-ST por caixa vendida ao distribuidor e repassa ao fisco.
Fluxo Financeiro e Fiscal do fabricante:
Fabricante: Venda ao distribuidor: R$100,00 + R$36,00 (ICMS-ST) = R$136,00 cobrado.
O ICMS-ST de R$36,00 é repassado ao fisco e não conta como receita do fabricante.
Portanto, apenas o valor de R$ 100,00 integrará a receita bruta da empresa, e irá compor a bse de calculo do PIS, PASEP e COFINS.
Assim, se as contribuições ao PIS/PASEP e COFINS não incidirem sobre o ICMS-ST na etapa anterior (substituto), na ausência de lei expressa criadora do crédito presumido, não podem gerar crédito para ser utilizado na etapa posterior (substituído).
Tema 1125/STJ.
Com o julgamento do Tema 1125/STJ (“O ICMS-ST não compõe a base de cálculo da Contribuição ao PIS e da COFINS devidas pelo contribuinte substituído no regime de substituição tributária progressiva”), o Superior Tribunal de Justiça equiparou a situação econômica dos contribuintes de direito do ICMS normal àquela dos contribuintes de fato do ICMS-ST, em razão do princípio da isonomia, tornando a escolha do Estado em tributar determinada mercadoria via ICMS ou ICMS-ST economicamente neutra para as contribuições ao PIS/PASEP e COFINS e, por consequência, para as empresas.
Se fosse concedido o creditamento, agora a a situação de injustificável privilégio passaria a ser dos contribuintes pelo modelo do ICMS-ST.
Caso hoje fosse concedido o creditamento, a distorção existente entre o contribuinte de fato do ICMS-ST e o contribuinte de direito do ICMS normal voltaria a ocorrer, desta vez em prejuízo deste último. Isso porque o primeiro, além de excluir o ICMS-ST da base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS por si devidas, também ganharia o direito ao crédito dos valores correspondentes ao ICMS-ST, caracterizando odioso duplo benefício (ganharia de volta o crédito sem ter o débito correspondente), sendo que o segundo nenhum benefício mais tem depois do advento dos os artigos 6º e 7º, da Lei n. 14.592/2023 (não tem crédito e não tem débito).
Portanto, conclui-se que:
#Tese Repetitiva – Tema 997-STJ:
II. Os valores pagos pelo contribuinte substituto a título de ICMS-ST não geram, no regime não cumulativo, créditos para fins de incidência das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS devidas pelo contribuinte substituído.
STJ. EREsp 1.959.571-RS, REsp 2.072.621-SC, REsp 2.075.758-ES, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 20/6/2024, DJe 25/6/2024 (info 818).
Custo de aquisição previsto no art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/1977.
O custo de aquisição, conforme definido no artigo 13 do Decreto-Lei nº 1.598/1977, é um conceito contábil que inclui todos os custos diretamente atribuíveis à aquisição de mercadorias para revenda e à produção de bens ou serviços.
Os tributos recolhidos em substituição tributária não integram o conceito de custo de aquisição previsto no art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/1977.
#Tese Repetitiva – Tema 997-STJ:
I. Os tributos recolhidos em substituição tributária não integram o conceito de custo de aquisição previsto no art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/1977; e
STJ. EREsp 1.959.571-RS, REsp 2.072.621-SC, REsp 2.075.758-ES, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 20/6/2024, DJe 25/6/2024 (info 818).
Motivos:
i) a lei foi publicada em período onde não havia substituição tributária progressiva (substituição tributária “para frente”) no Brasil, não podendo dar efeitos a algo que não existia, desta forma, sequer é possível instrução normativa que assim trate a matéria, sob pena de extrapolar a lei de regência;
ii) Os tributos recolhidos em substituição tributária “para frente” são mera antecipação de um tributo que incidiria na venda (não na aquisição) a ser feita pelo substituído, ou seja, não são juridicamente uma oneração na aquisição, mas uma oneração antecipada da venda a ser futuramente feita; e
iii) a classificação de “tributo recuperável” e “tributo não recuperável” não é aplicável aos casos de substituição tributária, porque monofásicos.
Nem todo custo de aquisição gera direito a creditamento.
Ainda que o ICMS-ST integrasse o conceito de custo de aquisição, esta Corte tem posicionamento pacificado no sentido de que nem todo o custo de aquisição gera direito ao creditamento na sistemática não cumulativa das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS. Precedentes em recursos repetitivos: REsp. n. 1.221.170/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 22.02.2018 e REsp. n. 1.894.741/RS, Primeira Seção, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 27.04.2022.
Conclusão…
Dessa forma, seja em razão dos limites impostos pelo princípio da não cumulatividade, seja em razão da impossibilidade de tratamento anti-isonômico entre os contribuintes, seja porque não configuram custo de aquisição e seja porque nem todo o custo de aquisição gera direito ao creditamento na sistemática não cumulativa das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS, os valores despendidos pelo contribuinte substituído, a título de reembolso ao contribuinte substituto pelo recolhimento do ICMS-ST, não geram créditos das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS não cumulativas.
STJ. EREsp 1.959.571-RS, REsp 2.072.621-SC, REsp 2.075.758-ES, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 20/6/2024, DJe 25/6/2024 (info 818).