Conceitos Necessários:
Desconsideração da Personalidade Jurídica: A desconsideração da personalidade jurídica é um instituto jurídico previsto nos artigos 28 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e 50 do Código Civil (CC), que permite que os efeitos de certas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica, em situações de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.
Grupo Econômico: Um grupo econômico é formado quando duas ou mais empresas estão sob a direção, controle ou administração de uma mesma empresa, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, estão submetidas a uma mesma vontade econômica.
Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica: O incidente de desconsideração da personalidade jurídica, previsto nos arts. 133 a 137 do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), é um procedimento específico destinado a apurar a ocorrência de abuso da personalidade jurídica, para posteriormente, se for o caso, atingir o patrimônio pessoal dos sócios ou administradores da pessoa jurídica.

Exemplo Didático:
Suponha que exista uma empresa chamada “A Ltda.” que perdeu uma ação judicial e agora deve cumprir a sentença pagando uma certa quantia em dinheiro. A empresa “A Ltda.” faz parte de um grupo econômico que também inclui a empresa “B Ltda.”. No entanto, a empresa “B Ltda.” não foi parte na ação judicial que resultou na sentença contra a empresa “A Ltda.”.

Agora, ao tentar executar a sentença, o credor tenta redirecionar a execução também contra a empresa “B Ltda.” para satisfazer o crédito, sem instaurar o incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

É possível redirecionar a execução para a empresa “B Ltda.” sem instaurar o incidente de desconsideração da personalidade jurídica?
Não.

Garantia do Contraditório e Ampla Defesa.
A previsão de responsabilidade civil subsidiária, inerente ao direito material, não exclui a observância das normas processuais, garantidoras do contraditório e da ampla defesa, incluindo, entre outras, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

Necessidade de instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica.
Nesse aspecto, numa interpretação sistemática do Código de Defesa do Consumidor, é possível observar que a previsão de responsabilidade civil subsidiária das sociedades integrantes de um mesmo grupo encontra-se inserida na seção que trata da desconsideração da personalidade jurídica.

Dessa forma, para que uma empresa, pertencente ao mesmo grupo econômico da executada, sofra constrição patrimonial, é necessária prévia observância dos procedimentos específicos da desconsideração da personalidade jurídica, que pode ser instaurada, inclusive, na fase de cumprimento de sentença ou na execução fundada em título executivo extrajudicial, nos termos do art. 134 do CPC.

Ressalte-se que a instauração do incidente de desconsideração é norma processual de observância obrigatória, como forma de garantir o devido processo legal.
Nesse sentido, a Terceira Turma desta Corte manifestou-se quanto à impossibilidade de mero redirecionamento do cumprimento de sentença àquele que não integrou a lide na fase de conhecimento: Uma vez formado o título executivo judicial contra uma ou algumas das sociedades, poderão responder todas as demais componentes do grupo, desde que presentes os requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica, na forma do art. 28, § 2º, do CDC, sendo inviável o mero redirecionamento da execução contra aquela que não participou da fase de conhecimento. (AgInt no REsp 1.875.845/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 16/5/2022, DJe 19/5/2022.)

Conclusão…
Uma empresa do mesmo grupo econômico da parte executada só pode ter seus bens bloqueados se o incidente de desconsideração da personalidade jurídica for previamente instaurado, não sendo suficiente mero redirecionamento do cumprimento de sentença contra quem não integrou a lide na fase de conhecimento.
STJ. REsp 1.864.620-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023 (info 789).

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